The Killers diminui a rotação e lança disco contador de histórias americanas

O guitarrista Dave Keuning (à esq.) voltou ao The Killers para gravar novo álbum
 

The Killers

Pressure Machine
⭐⭐⭐ 4/5

Por  Lucas Scaliza 

Pressure Machine é um disco para curtir sozinho ou em viagem. É sobre pessoas e suas histórias, sobre os lugares de onde elas vêm e nem sempre para onde vão. Drogas, as faces de Deus, ocorrências tristes, o acaso, o destino, o ocaso, as curvas do rio, as beiras da estrada. Nunca as letras foram tão importantes para um produto com o nome The Killers.

Esses são os elementos que povoam as letras dos mais de 50 minutos do sétimo disco da banda, que deriva do rock contador de histórias de gente grande como Bruce Springsteen (mas pode colocar também no caldeirão que também fazem isso Nick Cave, Bob Dylan ou até mesmo um Bon Jovi quando canta coisas como a história do Tommy e da Gina). Houve um cuidado bastante evidente para não caírem no lado mais pop de arena que o quarteto vinha desenvolvendo. O resultado é bastante equilibrado, tão pé no chão quanto as histórias que saem dos lábios de Brendan Flowers, e dá a Pressure Machine uma cara só para ele dentro do catálogo dos Killers.

Com o mundo encarando uma pandemia, sem ter como saírem pelo mundo de cidade em cidade, vivendo de hotel em hotel, de uma passagem de som para um público ensandecido a cada noite, a banda teve tempo de, em menos de um ano após
Imploding The Mirage, sentar e criar um disco conceitual bastante americano, e universal em certa medida. A base desse trabalho foram poemas que Brandon Flowers escreveu sobre sua vida pregressa na pequena Nephi, em Utah, misturado com contos sobre a Califórnia antiga (The Pastures of Heaven, de John Steinbeck) e curtas narrativas de pequenas cidades do Ohio (Winnesburg, Ohio, de Sherwood Anderson). Além de Ronnie Vannucci Jr. na bateria e Mark Stoermer no baixo, o guitarrista Dave Keuning topou fazer parte da empreitada em estúdio (se estará no palco com a banda, é outra história).

Pressure Machine não tem a força roqueira de antes, e nem era esse o futuro que a banda desenhava para si. Mas também não é um passo mais firme no terreno do ultrapop. É provavelmente um desvio temporário, um detour, tirando Flowers do pedestal e da posição de vocalista maior-que-a-vida em músicas bombásticas. O que Pressure Machine faz muito bem é contar histórias. Embora tenha músicas para o padrão radiofônico ("Quiet Town", "Sleepwalker", "In Another Life"), não é um trabalho que almeja escalar o topo da Billboard. Mas tão pouco pode-se dizer que é um disco despido de produção. É quando aposta na verve mais Springsteen que brilha mais, como em "West Hills", "Desperate Things" e a faixa-título.

Curioso como durante a mesma pandemia, conseguiram lançar o disco mais absurdamente estrondoso e o mais comedido. Em Imploding The Mirage havia uma série de participações especiais para fazer dueto ou contraponto a Brandon Flowers, mas no final era sempre a palavra dele que ganhava destaque. Dessa vez, apenas Phoebes Bridgers dá as caras, discretamente, em "Runaway Horses".

Ano passado, resenhando Imploding The Mirage, dei quatro estrelas como nota. Desta vez, dou quatro estrelas de novo para o The Killers. Pessoalmente, acredito que Pressure Machine seja um elemento mais nobre na discografia da banda do que o anterior, mas são propostas diferentes. Imploding era quatro estrelas para uma banda que queria soar daquele tamanho, com aquela pretensão. Pressure é quatro estrelas para quem dá um tempo das arenas e resolve subir no trem, contar a história de gente simples e lugares na encosta das colinas. E faz isso com muita consideração pelos dramas, carinho pelas alegrias e consciente do momento que vivemos.

Lucas Scaliza

Jornalista, músico sem banda e estrategista de marca. Não abre mão de acompanhar os sons do agora. Joga tarô e já foi host de podcast.

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