Reprodução Multishow
E os céus de São Paulo, para não quebrar a tradição, se fecham em cinza-chumbo sobre a Interlagos deste Lollapalooza, e o inevitável atraso no cronograma do festival se faz presente no aviso dos telões espalhados por todos os palcos. Encharcado, o público (majoritariamente feminino na grade) aguardava para conferir se as espirais de DNA se confirmam em Inhaler.
A banda, originária de Dublin, na Irlanda, é formada pelo baixista Robert Keating, o guitarrista Josh Jenkinson, o baterista Ryan McMahon e pelo vocalista e guitarrista Elijah Hewson e vem cavando o seu caminho desde 2012, lançando o seu primeiro single somente em 2017. Tendo em sua formação o filho (Elijah) de Bono Vox, do U2, o tempo até que se mostrou grande para esse trabalho ser consumado com a primeira gravação. De repente, justamente por isso, a possível hesitação em deixar fincada numa gravação a influência notória da banda mais midiática do planeta.
"Your House" do excelente Open Wide (2025), dá o pontapé inicial para um show que se mostraria linear e "combinandinho" com a chuva que ainda insistia em cair. A canção mostra que se o timbre vocal denuncia a filiação, o instrumental foge um pouco da similaridade. De fato, parece ser a intenção da banda, que compreensivelmente, vem demonstrando através da evolução de seus trabalhos a busca pela identidade própria (conversamos sobre isso no quadro do YouTube Redação Rock On Board, veja aqui).
Mas "Eddie In The Darkness" faz a banda dar uma meia volta na passarela e nos diz: "Hey, eu te lembro de algo?". Impossível não fechar os olhos e voltar no tempo, aos que viveram a juventude nos anos 80 e 90. A música, dançante e acelerada, faz a galera pular no mesmo lugar, quem sabe pra ajudar a secar a roupa, uma vez que a chuva estava amainando na frente do palco. Público esse, formado por lindas meninas bem maquiadas, cabelos cuidadosamente presos e protegidos por capas de chuva, que cantavam todas as músicas do início ao fim, formando coraçõezinhos com as mãos. A banda, bem jovem, tem esse apelo, sim, e deve ser aproveitado, claro.
A chuva ainda caia quando "When It Breaks" lá de 2021, é entoada por Elijah, que munido de uma camisa do Brasil, mantém uma postura tímida, aliviada pela guitarra empunhada (coisa que seu pai não fazia), mas a voz, ah, a voz! O timbre da voz, das guitarras, até mesmo o efeito reverb utilizado do Elijah. Rapaz, como não? É inegável a forte influência do início da carreira fonográfica do Inhaler.
"Open Wide" e "Who's Your Money On? (Plastic House)" vem em seguida, antes de Elijah finalmente se dirigir à plateia, saudando-a com o fácil "Oi, São Paulo" e "How Are You Doing? Are You Wet?". As meninas da grade, ainda encharcadas, riram gritando, não sei se de nervoso.
Em "My King Will Be Kind" eles abraçam o reino tropical, e por que não? Curtem o momento. Mas o sol se revela, literalmente, em "Dublin In Ecstasy". A canção do álbum Cuts & Bruises (2023) ainda traz o sotaque carregado das bandas indies britânicas. O que gera os gritos de "IN-HA-LER, IN-HA-LER!"
"Love Will Get You There" e "Billy (Yeah, Yeah, Yeah)" finalmente trazem o pop característico do grupo bem mais à tona e aí sim, a galera mais jovem presente no Lolla (os que conheciam já, a banda), vibram, cantando letra por letra, com sorrisão nos rostos.
"It Won't Always Be Like This" (do álbum homônimo de 2021) e a ótima "My Honest Face", com um instrumental extremamente oitentista (quase ouvi as indefectíveis harmônicas de The Eddie) encerram, com um arco-íris duplo abençoando a primeira visita desta banda que, com certeza, conquistou muita gente, de muitas idades, para as suas fileiras de fãs. Foi um belo show, digníssimo, para a sorte de quem viu.
