É
sabido por todos que o Sesc, em suas várias unidades, tem os melhores palcos do
país! Artistas são respeitados, com bons cachês e estrutura invejável, o público
é bem recebido, confortavelmente e com preços justos e os profissionais de
imprensa são sempre recebidos com atenção e carinho, de forma que muita
assessoria underground deveria se espelhar, pois muitos deixam a desejar em
vários aspectos.
A
unidade Belenzinho, especificamente, tem um projeto denominado “Música
Extrema”, que há vários anos abre as portas para artistas nacionais e
estrangeiros, dedicados ao “barulho”! E nesse projeto se insere a banda
paulistana RATOS DE PORÃO, que desde
1981 saiu da Vila Piauí “odiando a tudo e
todos”, parafraseando uma velha estampa de camiseta da banda vendida anos
atrás. O pretexto dessas duas apresentações, com casa absolutamente lotada, é a
turnê comemorativa dos 40 anos do primeiro LP dos caras, “Crucificados pelo
Sistema”, completados ano passado. Mas na prática, fizeram em dois shows
insanos um balanço de toda a carreira, recém-chegados de mais uma turnê na
Europa, onde, desta vez, fizeram concorridos shows em Portugal, Irlanda,
Irlanda do Norte e Inglaterra.
O
repertório das duas noites foi praticamente o mesmo, apenas uma mudança pontual
(na sexta-feira tivemos “Suposicollor”, do álbum “Just Another Crime... in Massacreland”, de 1993, trocada por
“Herança”, do clássico “Brasil”, de
1989, no sábado) e empolgou demais. Fato que o público do sábado me pareceu
mais animado, o que é até normal, imaginando que na sexta-feira o público vindo
direto do trabalho, com o trânsito caótico de São Paulo, naturalmente estava
mais cansado.
Foto: Ricardo A. Flávio |
A banda sobe ao palco e já manda “Ódio³”, do disco “Anarkophobia”, de 1991, que já é para mandar para lona logo de cara, sem amaciar nada. Em seguida mandam “Anarkophobia”, “Amazônia Nunca Mais” e o hit “Sofrer”! Pronto, o jogo já está ganho e daí em diante o que vier é lucro! O vocalista João Gordo sempre é falante e solta impropérios diversos destinados, principalmente, para a ala direita da política brasileira: cita a deputada Carla Zambelli – “a vaca fugiu”, fala também de Neymar, Nicolas Ferreira, “mini pastor” – fenômeno viral na internet, e a banda toca “S.O.S. País Falido”.
Sequência
devastadora com “Morrer”, “Cérebros Atômicos” e “Juventude Perdida”, para logo
em seguida Gordo dizer que “nós avisamos
que ia dar merda”, e emendam “Alerta Antifascista”, do álbum “Necropolítica”, de 2022. O guitarrista Jão
está endiabrado, tirando riffs e solos assombrosos, e a cozinha formada pelo
baixista Juninho e o baterista Maurício Boka é uma das melhores do
país e não é de hoje.
E
logo chega uma trinca do disco “Crucificados
Pelo Sistema”, a faixa título, “Não me Importo” e “Caos”! O pogo está
insano, com presença de punks velhos, misturados com algumas garotas e uma
molecada que rejuvenesceu, e muito, o público da banda – cheguei a conversar
com o guitarrista Jão sobre isso
antes do show, e até a banda se impressiona com esse fenômeno da mudança no
público, hoje a grande maioria de quem vai aos shows dos Ratos de Porão está na
faixa dos 20 anos! O rock vive, e bem!
Foto: Ricardo A. Flávio |
Gordo explica que a próxima música tem a ver com a população de rua que ele ajuda com seu projeto Solidariedade Vegan, que durante a pandemia começou alimentar centenas de moradores da chamada “cracolândia”, e permanece até hoje esse trabalho social, diz que hoje é arrependido de chamar esse povo assim, mas, a música está feita, “Exército de Zumbis”, que faz parte do split lançado em conjunto com a banda espanhola Looking For An Answer, em 2010.
A
banda está muito bem, tudo certinho e bem feito, não existe nenhum detalhe a se
mudar, a presença de palco de todos é alucinante, se entregam literalmente, e o
público vem junto, animado, empolgado, extasiado! Mais discurso de Gordo e a banda toca “Difícil de
Entender”, do disco “Carniceria Tropical”,
de 1997. “Toma Trouxa”, “Arranca Toco”, “Conflito Violento”, “Crocodila”,
“Suposicollor”, na sexta-feira, “Herança”, no sábado, não deixam a temperatura
cair, o pogo é insano e não para de jeito nenhum.
Do
disco “Cada Dia Mais Sujo e Agressivo”,
de 1987, a banda toca “Sentir Ódio e Nada Mais”, onde Jão vira um guitar hero, detona em riffs e solos
alucinantes, esses malditos traidores do
movimento, traíram em grande estilo (há ironia, por favor)!
E para
encerrar as duas noites, três faixas de “Brasil”:
os hits “Beber até Morrer” e “Aids,
Pop, Repressão” e “Crianças Sem Futuro”, duas noites insanas, com um verdadeiro
estandarte do rock brasileiro, os Ratos
de Porão não devem nada a ninguém! Fazem um som honesto e excelente! Lá
fora são respeitados, tocam em festivais junto de bandas do naipe de Slayer ou
Black Sabbath e aqui no fim do mundo, ainda tem quem ache que eles precisam
provar algo, e eu digo: não precisam!
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