No ano em que celebra seu vigésimo aniversário, era
natural que o Rock in Rio Lisboa investisse um pouco na nostalgia ao mesmo tempo em
que se mudava para uma “casa” nova no Parque Tejo. E ter o Scorpions como
headliner da primeira noite, foi como reencontrar um velho amigo depois de
alguns anos. Especialmente porque a própria veterana banda alemã vive um
momento de celebração do passado.
O Scorpions que fechou a primeira noite do festival é a banda que está em turnê comemorativa de seu nono álbum Love At First Sting, que completa quatro décadas neste ano de 2024. Esse é o disco que tem sucessos como “Rock You Like A Hurricane”, “Still Loving You” e “Big City Nights”. Todos foram tocados e muito celebrados pelo público que ficou até o fim do show no Parque Tejo.
- Vamos voltar para os anos 80. Vocês estão prontos para os anos 80? - perguntou o vocalista Klaus Meine durante o show em Lisboa. - É bom voltar a Portugal e ao Rock in Rio - completou o cantor, cuja banda estava tocando pela nona vez em Lisboa, mas a primeira no Rock in Rio local.
É claro que o Scorpions de 2024 é
muito diferente da banda que foi uma das estrelas da primeira edição do Rock in
Rio brasileiro no longínquo ano de 1985. Seus integrantes estão mais velhos e
especialmente para Meine, de 76 anos, fica evidente que não há mais o mesmo
alcance vocal. E até para poupar o seu cantor, há longos trechos instrumentais,
solos de guitarra e bateria, e pausas durante 1h30min de show. O set
instrumental, inclusive, entre “The Zoo” e a ótima “I’m Leaving You” é muito
bom.
Por outro lado, é preciso
respeitar quando se está diante de uma lenda como Meine e os Scorpions. Uma
banda com tanta história que pode se dar ao luxo de tocar praticamente na
íntegra um álbum inteiro sem deixar a qualidade do seu show cair um segundo sequer.
Além de celebrar os 40 anos
daquele que é um dos seus principais álbuns, os Scorpions também pregaram a paz
e o amor em tempos tão sombrios como os que perpassam a Europa - especialmente por
causa da guerra entre Rússia e Ucrânia - e depois dos resultados das recentes
eleições para o parlamento europeu, como na França e na Alemanha natal da banda
de Hannover. Ambos os países que viram um perigoso avanço da
extrema-direita.
Em nome da paz, o Scorpions
dedicou o seu hino pacifista “Wind of Change”, mas agora com a nova versão da
letra que vem sendo tocada nas últimas turnês. Em 2022, Meine resolveu trocar a
abertura da canção de “I Follow The Moskva/Down To Gorky Park... Let Your Balalaica Sing”, que faziam referências a Rússia, pra “Now Listen To My Heart/It Says
Ukrainia/Waiting For The Wind To Change”. Quando decidiu mudar a letra, Meine
disse que não queria mais romantizar a Rússia por não considerar isso certo
neste momento. A mudança soa estranha, especialmente para quem passou décadas ouvindo
a versão original. Contudo, a atitude da banda mostra que ela não está alheia
aos acontecimentos políticos do planeta, o que torna uma canção com “Crossfire”,
igualmente necessária no show do Scorpions. Uma música que tem uma bateria num
ritmo de marcha militar muito marcante e, segundo explicou Meine, fala sobre a
vida numa Alemanha dividida entre leste e oeste em meio a Guerra Fria.
O baterista Mikkey Dee, aliás, é um show à parte. Assim
como a dupla de guitarristas Rudolf Schenker e Matthias Jabs. São eles que não
deixam o ritmo do show cair o tempo inteiro e vão se revezando no protagonismo
enquanto Meine fica quase como um crooner comandando a orquestra e a plateia. Em
muitos momentos ele pede à plateia para cantar junto, como em “Bad Boys Running Wild” e na balada “Send Me An Angel”.
O jornalista Marcelo Alves, repórter do Rock On Board, acompanhou o festival presencialmente.