New Model Army: demasiado honesto. Dolorosamente genuínos

Foto: Ricardo A. Flávio

A frase do título desta matéria foi dita por um fã e retirada do documentário “Between Dog and Wolf”, lançado pelo NEW MODEL ARMY em 2014, e que narra a história da banda desde o seu nascimento, em 1980, até o ano em questão (e já merece uma segunda parte). E a escolhi, pois representa e define grandemente o que é o New Model Army, muito mais que uma banda, uma instituição.

A Liberation Music Company é a responsável por esta turnê e depois do show acústico da quinta-feira em São Paulo, a banda esteve na sexta-feira em Curitiba e, por todos os comentários na internet e relatos dos que estiveram lá e vieram acompanhando a banda para a segunda apresentação paulistana, o que ocorreu na capital paranaense foi avassalador. Gerou expectativa gigantesca. Segundo amigos que conversaram com Justin Sullivan no Paraná, lá a banda não tocava há 33 anos e por isso o repertório foi mais abrangente, para esta segunda apresentação em São Paulo, privilegiaram mais os últimos trabalhos, visto que aqui foram ‘apenas’ 6 anos ausentes.

Para a esta data o clima é de matinê, a casa abriu ainda durante a tarde e pontualmente às 18h a banda paulistana Os Brutus entreteriam a galera com seu animado repertório de surf music instrumental, curto, coeso e agradável show para aquecer as turbinas para o que virá em sequência. Os fãs ardorosos de New Model Army lembram que a mesma banda abriu com a mesma simpatia os shows da turnê de 2018.

Passados alguns minutos das 19h e Justin Sullivan, guitarra, violão e vocal, Dean White, guitarra, Ceri Monger, baixo e percussão, Nguyen Green, tecladista incorporado recentemente à banda e Michael Dean, baterista, entram no palco em grande estilo, tocando “Coming or Going”, faixa presente no mais recente e ótimo disco da banda, “Unbroken”, lançado em janeiro deste ano.

“States Radio”, faixa de “Today is a Good Day” (2009) é a próxima tocada e voltamos ao disco novo, com as duas primeiras na sequência: “First Summer After” e “Language”, que já são cantadas por boa parte dos fãs que lotam a casa nesta noite. É sempre interessante notar que o público dessa banda, assim como os artistas, não param no tempo, não ficam esperando apenas os hits, a evolução é conjunta.

Tocam “Winter”, faixa título do disco de 2016 e o público acompanha tudo o que vem do palco com entusiasmo. “Stormclouds”, presente no disco “Between Dog and Wolf” (2019) precede outra nova, a ótima “Do You Really Want to Go There?”. Até aqui só coisas mais recentes, e chegamos ao disco “From Here”, de 2019, com “Never Arriving”.

O público está totalmente entregue, e a coisa fica séria, mandam “Here Comes the War”, clássico presente em “The Love of Hopeless Causes”, disco de 1993. Eles nem precisavam tocar mais nada, mas continuam a apresentação com duas músicas do disco “Thunder and Consolation”, de 1989: “225” e “Green and Grey”, que leva muitos às lágrimas e é quando os fãs ingleses que vieram acompanhar a turnê latino-americana fazem como nos shows da Europa e montam uma “pirâmide” humana na pista. Emocionante.

A belíssima música “Idumea”, outra faixa de “Unbroken” é tocada, com destaque para Ceri Monger que assume a percussão enquanto Justin Sullivan assume o baixo. E o êxtase total se impõe com “51st State”, o maior sucesso da banda, uma versão honesta da canção de Ashley Cartwright, da banda The Shakes  – muitos não sabem que se trata de um cover.

“Angry Planet”, é tocada, faixa presente no álbum “Between Wine and Bloody”, de 2014, uma continuação do álbum anterior (”Between Dog and Wolf”), numa caprichada edição híbrida: um disco metade feito no estúdio, com seis faixas inéditas e a outra metade gravada ao vivo.

“Purity”, clássico do disco “Impurity”, de 1990 e a pesada “Wonderful Way to Go”, música que abre o disco “Strange Brotherhood”, de 1998, encerram a primeira parte do show, com muito suor, entrega e lágrimas.

No mesmo instante em que a banda sai do palco, o público da frente entoa um cântico que emula o solo de violino da música “Vagabonds” do disco “Thunder and Consolation”. Cântico esse que em segundos toma toda a casa. Justin Sullivan volta, diz que não fala português, mas gesticula dizendo que a banda não tem violino para tocar essa. O coro continua e ele se entrega, diz então “vamos fazer um teste”, sozinho na guitarra e com a plateia a plenos pulmões: o teste foi lindo e perfeito, mais um momento emocionante do show.

“The Hunt”, do disco “The Ghost of Cain”, de 1986 – gravada pelo Sepultura no álbum “Chaos AD” (1993) e “I Love the World”, mais uma do fantástico “Thunder and Consolation” encerram a missa. O público se abraça, celebra e muitos já se movimentam para ir ao Rio de Janeiro, onde a banda encerra hoje, no mítico Circo Voador, o braço brasileiro desta turnê. E já começamos a contar o tempo para mais discos e mais shows do New Model Army, muito mais que uma banda, uma instituição, como dito lá no começo. É isso, "The Family" unida e feliz.

Ricardo Cachorrão

Ricardo "Cachorrão", é o velho chato gente boa! Viciado em rock and roll em quase todas as vertentes, não gosta de rádio, nunca assistiu MTV, mas coleciona discos e revistas de rock desde criança. Tem horror a bandas cover, se emociona com aquele disco obscuro do Frank Zappa, se diverte num show do Iron Maiden, mas sente-se bem mesmo num buraco punk da periferia. Já escreveu para Rock Brigade, Kiss FM, Portal Rock Press, Revista Eletrônica do Conservatório Souza Lima e é parte do staff ROCKONBOARD desde o nascimento.

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