Devotos fala sobre novo álbum: "Será uma homenagem ao reggae!"

Devotos falou com exclusividade sobre novo álbum [Foto: Tiago Calazans]
 

Por  Ricardo Cachorrão Flávio 

No último dia de junho, chegou em todas as plataformas digitais o novo single da banda pernambucana DEVOTOS, “Nossa História”, música inédita que fará parte do novo projeto deles, Devotos Punk Reggae - uma homenagem do trio formado por Cannibal, baixo e voz, Neilton Carvalho, guitarras e Celo Brown, bateria, ao ritmo jamaicano tão presente na vida da rapaziada.

Logo após a primeira audição, entrei em contato com o guitarrista e artista plástico Neilton Carvalho, responsável por todas as capas e ilustrações da banda, e a pergunta foi direta: 

Vem aí um disco de reggae da Devotos?

“Isso mesmo! Essa ideia é antiga, já tem um tempo que tentamos colocar esse trabalho em prática. Desde 2000, ou seja, desde o segundo disco que colocamos alguma música no estilo, desde antes disso que compomos algumas músicas no estilo, só que no primeiro disco não gravamos nenhuma, vacilo. Esse ano nós estamos com uma nova produtora e aí eles toparam encarar com a gente esse projeto. Conseguimos juntar as pessoas certas e aprovar o projeto esse ano.”, disse o guitarrista.

Mas teremos edição física?

“Estamos na luta com alguns parceiros para lançar em vinil ainda esse ano. Juntando forças para isso.”

Além de Neílton, falamos também com Cannibal, baixo, voz e letras da Devotos (também vocalista da banda reggae / dub CAFÉ PRETO). 

Disco de Reggae com a Devotos?

“Ricardo, cara... pra muita gente, assim, principalmente quem não conhece a Devotos, é até uma coisa surpreendente, uma surpresa... mas para nós, velho, e para que acompanha a gente, não é não! Porque eu, principalmente, escuto muito reggae, sempre escutei muito reggae. Até dentro do movimento punk aqui de Recife a gente escutava muito reggae. Então, assim, tá muito na nossa vivência! A primeira banda de reggae do Brasil foi Os Caretas, né velho? E Os Caretas é daqui do lado do Alto José do Pinho! Então a gente tem uma amizade muito grande com a galera do reggae... e alguns participaram dos nossos discos antigos, como o Marcelo Sant'Ana e a gente tem convivência com os caras, com o Ivano também, que foi um dos primeiros reggaeiros daqui de Recife.


Marginalização do Reggae

"Não sei em outro lugar, que eu não acompanho, mas a marginalização do Punk e do Reggae aqui em Recife é muito parecida tá ligado? Culturalmente falando! Para você ter ideia, no movimento de reggae aqui no Recife, quem domina são os produtores, que faz os grandes shows, a galera das antigas, os loop de reggae que tem aqui, praticamente não tocam em grandes eventos, então é muito, mas é muito parecido, e a nossa temática de letra, de música é muito parecida também, que a gente fala muito do cotidiano".

Banda punk tocando reggae?

"Para nós é muito tranquilo! Você morar no Alto José do Pinho, num bairro que tem maracatu, tem afoxé tá ligado? Tem várias manifestações culturais, caboclinho, maracatu de baque solto e maracatu de baque virado... Então você cresce com a mente muito aberta para música e de repente vem os pops assim, das rádios né... sonoramente falando, de rock que a gente curtia, bandas como Legião, Capital Inicial, essas paradas todas... Paralamas do Sucesso! Po, Paralamas é uma prova disso, assim... Uma coisa pop, que misturava o pop com o reggae, o pop rock com o reggae, você pensa nos Paralamas.

Disco único na carreira

"Esse disco que a gente tá fazendo agora, o Devotos Punk Reggae é tipo um disco de homenagem, assim, tipo como se fosse uma homenagem para o reggae. E é uma parada que a gente não vai fazer mais, não vai se repetir, não vai. Não vamos ficar batendo nessa tecla, tipo, o lançamento, e os shows, vai ser com essa galera que participou desse disco. Passou isso, já volta o que era Devotos normal... punk, rock, hardcore com uma música ou duas de reggae, mas a gente mesmo fazendo, ou seja vai ser um disco que vai virar uma coisa muito importante, assim do lado que todo mundo vai querer ter! O colecionador vai querer ter, mas não vai ser uma coisa que vai se repetir. É mais como homenagem mesmo e mostrar que a gente tem um respeito muito grande pelo reggae, a gente escuta muito, mas ninguém é de dentro... assim, ninguém tá dentro da Cultura Reggae, que pra algumas bandas chega a ser uma coisa religiosa... a gente não tá, mais a gente respeita muito, e é uma forma de homenagear e também saber e mostrar que a gente tá muito ligado."

Movimentos com as mesmas temáticas

"Um movimento é muito parecido do outro. O reggae e o punk são muito parecidos. Com as suas temáticas, é muito parecido nas suas discriminações, de eventos, de produtores, da cadeia fonográfica, que hoje em dia é muito pouco por causa da tecnologia, que se entende a internet, mas na época da gravadora, poucas bandas de reggae, como de punk, se gravava... Nacional, do Brasil."

Gravação e produção

"A ideia de fazer o Punk Reggae é essa, pegar aquelas músicas que a gente sempre teve de punk reggae e fazer uma nova roupagem, ela Roots, trouxemos um produtor muito foda, que é o Pedrinho, produtor e arranjador e trouxemos também o Matias, que é o cara que sempre grava o Devotos, então para ter aquela lembrança também do punk e não tem uma parada 100% reggae que isso nunca vai ter porque gente não é do Reggae, mas a gente conseguiu fazer uma parada que a gente gostou, que a gente pensou desde o começo... já que é para fazer o disco com as músicas que era de punk e reggae, então vamos fazer uma parada Roots, uma parada bem foda, e vamos chamar alguém que é de dentro, que entende pra caralho, muito mais que a gente, então é isso aí..."

Canção Inédita

"Tinha que ter uma música inédita né? E aí a música que rolou foi essa que se chama “Nossa história” que é uma parada já bem... bem de agora... de agora que eu digo assim, em termos de letra né? De tá usando muito que eu tô lendo, de tá usando muito do que eu tô vendo no cotidiano da vida da gente né, nacionalmente falando, e que você termina pensando nas coisas que aconteceram desde a descoberta do Brasil, como o estupro dos holandeses aqui dentro do Brasil, e você ver que até hoje é praticamente muito igual, até o os meios de escravidão são diferentes, mas é escravidão do mesmo jeito tá ligado? Do jeito que as pessoas trabalham, do jeito que as pessoas se comprometem a manter esse país né, na mão dos governos, né? Então a gente fala de tudo isso e de repente a gente tá falando das classes também, que antigamente as brigas, as lutas eram cada um no seu quadrado né? Negritude lutando pela negritude, LGBT lutando pelos LGBT, gordos lutando contra a gordofobia e agora a gente vê que é todo mundo lutando por todo mundo tá ligado? A tecnologia fez a gente ter essa aproximação, todos lutando por todos, assim as classes mais oprimidas, não estão cada um no seu quadrado, tá todo mundo se ajudando, sejam índios, sejam quilombolas tá todo mundo se ajudando, então, acho que isso aí também tá na letra."

Explicando a letra

"E as inspirações em pessoas que fizeram a história né? Uma história positiva dentro da nossa sociedade, mas que as escolas, o governo e as escolas fizeram questão de não colocar nos livros né? Não se estuda sobre isso... se pesquisa sobre Luísa Mahin, sobre Luís Gama, se pesquisa sobre... sobre Maria Bonita, sobre o Cangaço. Mas a gente não estuda sobre isso, então a gente saber que o primeiro palhaço negro, Benjamin de Oliveira, nos anos 30, foi o primeiro palhaço negro, isso aí é pesquisa tá ligado? A história de ter o Grande Otelo, a história de você, de você... a gente que tem uma mente mais aberta para a sociedade, uma mente mais aberta pra coisa mais democrática, a gente sabe que para uma guerra, você não pode ir com rancor, você tem que ir com esperança, tem que ir com alegria, até mesmo com um certo sorriso e eu acho que o Grande Otelo é a cara do Brasil, quando você pensa em um sorriso, é um cara negro, um cara sofrido, mas sempre trabalhou rindo e isso contagia quem tá vendo, contagia a gente que luta por igualdade! Porra, velho... esse cara... aí você vê um carroceiro, cantando né? Você vê um carroceiro pegando lixo, pegando papelão pela rua e o cara tá cantando, tá fazendo alguma coisa, tá feliz e de repente vem um cara que tem um puta de um emprego no prédio, num puta de um prédio, o cara tem um puta de um emprego, dono não sei quantas fábricas, se suicidar! Então, assim, tem umas coisas que a gente tem que aprender muito com a gente mesmo, e essa letra fala sobre isso, é por aí.”


Então é isso... os reggaes da Devotos nós conhecemos, agora fica a ansiedade de ouvir os novos arranjos de canções como “Orixás”, “Periferia Fria” ou “Dança das Almas”. Que venha o Punk Reggae.

Ricardo Cachorrão

Ricardo "Cachorrão", é o velho chato gente boa! Viciado em rock and roll em quase todas as vertentes, não gosta de rádio, nunca assistiu MTV, mas coleciona discos e revistas de rock desde criança. Tem horror a bandas cover, se emociona com aquele disco obscuro do Frank Zappa, se diverte num show do Iron Maiden, mas sente-se bem mesmo num buraco punk da periferia. Já escreveu para Rock Brigade, Kiss FM, Portal Rock Press, Revista Eletrônica do Conservatório Souza Lima e é parte do staff ROCKONBOARD desde o nascimento.

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