The Exploited faz showzaço no Rio com Wattie Buchan no sacrifício

Foto: Rom Jom / Rock On Board
 
Circo dos horrores, sobrevivência ou desespero? Qual é a necessidade em continuar rodando o mundo numa suposta turnê de despedida do The Exploited?

Passaram 35 minutos e vemos o esforço físico do Wattie Buchan em continuar a apresentação. Muitos entra-e-sai pela coxia do lado direito do palco. A plateia comenta o que está vendo. Pensam em balão de oxigênio, vemos que volta com rosto molhado, vemos que tenta respirar. Sim, ficou internado no dia anterior e não se apresentou em Belo Horizonte. Após o show soubemos numa postagem nas redes sociais do vocalista, que ele estava com pneumonia.  

Durante o show, Wattie sente algo sair da sua boca, olha para o chão e passa a mão tentando identificar. Não para de cantar, passa a mão no moicano vermelho e olha os dedos certificando-se que não é tinta vermelha o que viu no chão. É visível nos olhos do velho gladiador inglês a incerteza. Falta pouco para terminar o set. Muitos querem acreditar que líderes de bandas e vocalistas são super heróis, invencíveis e cheios de super poderes que derrubam estádios e lideram multidões.

Foto: Rom Jom / Rock On Board
 
Quando envelhecem e a energia fica algo escassa ou falha, começam a surgir os boatos, comparações e medos. Wattie entra no Circo fungando o nariz e com calor, mas cria pequenos intervalos para molhar o rosto para depois secar o corpo com uma toalha, beber água e cuspir, para realmente dar 100% do que os fãs esperam dele. Vamos de "Beat the Bastards", "I Believe in Anarchy", "Porno Slut" apresentada como "uma canção de amor punk rock". Aos trancos e barrancos continuamos atentos ao desafio encarado pelo vocalista, sem anunciar em nenhum momento seu estado de saúde (porém, é visível que lhe falta ar e está cansado, mas vai continuar no ringue até o fim). Quase uma versão senil do falecido Keith Flynt, semelhante a uma iguana de crista vermelha, ri e agita a multidão com um microfone. No transcurso do show vemos que continua com dificuldades e vomitando no palco. Mesmo assim, não para de gritar as letras e levar a apresentação contagiante para níveis frenéticos (não é possível que no dia anterior estava internado em Belo Horizonte e hoje ainda na convalescença, e agite com tanta força).

Foto: Rom Jom / Rock On Board
 
O Exploited que está no Circo Voador é extremamente técnico, baterista acelerado sem perder o ritmo uma única vez. Um metrônomo preciso e demolidor. O duo de músicos com dreadlocks no baixo e na guitarra, em completo uníssono musical junto com a bateria, cobre qualquer deslize ou erro do Wattie. O Exploited 2025 não tem um som sujo ou caótico. Muito mais metal crossover do que punk rock clássico. Não existem erros na impressionante apresentação. Sim, o som está estupidamente alto, um cruzamento Motorhead x Ratos de Porão, como uma patada de 10 toneladas no crânio. 45 anos de excessos ou 40 anos de rodas punks, indiscutivelmente líderes eternos de algo que foi o verdadeiro inimigo do sistema político social excludente do início dos anos 1980, no Reino Unido. "USA" tem bandeira da Palestina no palco e galera rasgando uma dos Estados Unidos da América. No Rio de Janeiro as coisas sempre são exacerbadas, intensas e tangíveis (não duvide nunca em ver seu show favorito no Circo Voador).

Wattie sai novamente do palco e o baixista pega a bandeira da Palestina e chama a plateia para subir no palco. "Chegou o momento, venham, os seguranças não vão fazer nada". Umas 30 ou 40 pessoas estão no palco, a maioria sem camisa, e todos cantam "Sex And Violence", como uma torcida organizada numa arquibancada de um estádio de futebol. Os instrumentos sem cabos fazem tudo mais fácil. Wattie volta e começa o processo de despedida, sem muita firula ou fragilidade. O inglês, ex-soldado do exército, não deixa de vibrar com a plateia que grita "Ole Ole Ole, Wattie, Wattie". "PUNKS NOT DEAD" aos berros e comoção geral. Estamos fazendo história e não sabemos disso ainda.

Uns 30 minutos depois, na conta pessoal nas redes sociais, o vocalista posta um vídeo agradecendo o Rio pela noite agitada e afirma: "estou cuspindo sangue, estou ferrado, vou ver o que está acontecendo, vocês foram ótimos".

No domingo seguinte, em São Paulo, Exploited fez show com convidados e sem o vocalista, que ficou muito fragilizado. Numa turnê de shows seguidos passando por aeroportos e enfrentando temperaturas díspares. Sim, pode-se dizer que o Exploited deu o sangue pelo punk rock no Rio de Janeiro.

Loquillo Panama

Nômade agregador de ritmos musicais e fanático por shows. Está sempre correndo atrás de novidades para multiplicar e informar os amantes de boa música.

2 Comentários

  1. Texto quase tão bom quanto o show.
    Quem perdeu esse "last show" consegue captar um pouco do que foi através dessa narrativa.
    Alex

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  2. Estava fotografando da coxia. Vi Wattie a dois passos de mim tomando oxigênio e voltando pra guerra. Mais de duas vezes!

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