Os Insociáveis lançam seu disco de estreia, “Estranhas Sensações de Vida”

Foto: Eli K. Hayasaka

Voltarei em 2022, quando apresentei aqui mesmo no site a banda OS INSOCIÁVEIS, escrevi:

Em minha época de moleque, quando colecionava figurinhas, geralmente de rock ou futebol, existiam as “figurinhas carimbadas”, que eram àquelas mais importantes e difíceis de conseguir. Pulando uns 40 anos nessa conversa, chegamos em 2019, ano em que algumas “figurinhas carimbadas” do punk rock de São Paulo resolvem dar um chute na mesmice e montam OS INSOCIÁVEIS, banda de punk rock, cru, direto, com o intuito de dar uma sacudida no ambiente e resgatar toda a sua rebeldia juvenil, que ainda escapa pelos poros de cada um deles.

Chegamos em 2025 e, depois do lançamento de inúmeros singles e um EP nas plataformas digitais, com um repertório já bem conhecido e entoado pelos fãs em todos os energéticos shows da banda em qualquer lugar que seja, Ariel Uliana, vocal, Rogério Martins, guitarra, Luiz Cecílio, baixo e Douglas Vieira, bateria, lançam o primeiro LP, “Estranhas Sensações da Vida”, num caprichado lançamento da gravadora Red Star Recordings, em edição limitada de 300 cópias, em vinil de 180g, que se você for esperto corre atrás para não se lamentar depois – importante frisar, ao contrário do que é o normal hoje em dia, este disco ainda não está nas plataformas digitais, se você não tem o vinil, não ouvirá.

O álbum abre com a inédita “Movimento”, com letra do caçula da trupe, o baixista Luiz Cecílio, que, de tanto andar no meio dos velhos punks, ouviu tanta conversa que mandou bem, lembrando-se da origem e afirmando que o punk ainda está em movimento. O disco segue com “Patéticos e Covardes”, de Ariel, e “Insociável”, parceria entre Ariel e Luiz, duas já conhecidas e que foram lançadas como singles ainda no ano passado. Destaque aqui para a participação especial de Nicolle Bartolassi, dividindo os vocais com Ariel em “Insociável”.

Teorias Condizentes” é outra já conhecida, com letra de Ariel e aqui destaco que além da cozinha coesa, num belo entrosamento de Luiz e Douglinhas, o Rogério esmerilha na guitarra, além de um riff marcante, solou bonito! Sim, punk tem solo!

Foto: Divulgação

O disco até aqui tem letras divididas e todas as músicas compostas pelos quatro membros da banda, e segue com “Juventude”, uma faixa que é herança dos Invasores de Cérebros, a outra banda queridinha do Ariel, que fez a letra com música do Luiz Abbondanza, que já foi guitarrista dos Invasores e eventualmente aparece tocando nos raros shows tributo aos Restos de Nada, a primeira banda punk do Brasil, de 1978, em que Ariel é o vocalista. Um hardcore curto, seco e certeiro, com vocal debochado que só Ariel sabe fazer.

Vigilantes” apareceu no primeiro single da banda, ainda em 2019, e vem seguida de “Cara Descascada”, música que tem letra de Miro de Melo, o baterista fundador da banda, que se afastou para se dedicar aos seus outros trabalhos, como vocalista das bandas Miro de Melo & Os Bregapunks e a 365, essa ganhou clipe do cartunista Leandro Franco à época, relembre aqui:


O lado A se encerra com “Amar e Morrer (em Detroit)”, uma homenagem de Ariel para a cidade norte-americana do estado de Michigan, que para muitos é lembrada como a capital mundial da indústria automobilística, mas, para quem vive e respira rock and roll, é de onde saíram artistas dos mais emblemáticos da história da música, como The Four Tops, The Temptations, Parliament / Funkadelic, ou o que nos interessa aqui The Stooges e MC5, lembrados na letra... ”Miss X, you’re so near”!

Virando o disco, temos o riff instigante de “Um Levante Incendiário” dando a cara, em outra letra do Luiz Cecílio que mostra que aprendeu direitinho com os mestres a botar o dedo na ferida e dar seu grito de rebeldia! Aqui, finaliza com toda pompa e circunstância: “Foda-se o fascismo! Foda-se a homofobia! Foda-se o machismo! Foda-se o sistema!”.

E o disco segue agora com o velho anarquista Ariel dando as cartas e o grito rebelde em “Sobre Esquerdas e Direitas”, outra das inéditas, que começa diferentona de todo o disco, algo que lembra um power pop, que logo descamba para um punk rock puro e simples, mas que quem frequenta os shows da banda já conhece e canta junto: “Direita / Esquerda / Esquerda / Direita / Tudo cheira a Merda!

Foto: Dani Montero @dani.harta

Em Estado terminal” é urgente e direta, outro soco na cara dado pelo Luiz Cecílio e vem seguida de “Dançando com a Morte”, esta com letra do poético baterista Douglinhas, o menino além de gente boa e de ter braço pesado, escreve bonito. Na sequência “Carta do Futuro”, de cuja letra saiu o título do primeiro single lançado pela banda lá em 2019: “Vai piorar”, já avisava o Luiz Cecílio.

Suicídio” é um cover certeiro, numa homenagem ao amigo Zorro, que nos deixou anos atrás, tocou com Ariel nos Invasores de Cérebros e era o cara da icônica banda M-19, que chegou a participar do mítico festival e LP ao vivo “O Começo do Fim do Mundo”, no Sesc Pompeia, em 1982.

E o disco, dedicado à memória de Tina Ramos, a celebrada “Grande Dama do Punk Rock Nacional”, esposa de Ariel e que nos deixou precocemente, chega ao final com “Sangue”, letra de Ariel, de onde foi tirado o título deste álbum. A música é caprichada e tem espaço para todos mostrarem suas habilidades, baixo, bateria, guitarra ‘fantasmagórica’, letra e voz, unidos para encerrar em grande estilo um excelente álbum, que mostra que o punk rock permanece em movimento e que não precisa se acomodar, pode sair da mesmice, pode experimentar, incluir novas referências, timbres e, ainda assim, permanecer um punk rock autêntico, visceral, com conteúdo e que, como manda o figurino, soca o dedo na ferida, sem dó ou piedade. Vida longa aos INSOCIÁVEIS!



Ricardo Cachorrão

Ricardo "Cachorrão", é o velho chato gente boa! Viciado em rock and roll em quase todas as vertentes, não gosta de rádio, nunca assistiu MTV, mas coleciona discos e revistas de rock desde criança. Tem horror a bandas cover, se emociona com aquele disco obscuro do Frank Zappa, se diverte num show do Iron Maiden, mas sente-se bem mesmo num buraco punk da periferia. Já escreveu para Rock Brigade, Kiss FM, Portal Rock Press, Revista Eletrônica do Conservatório Souza Lima e é parte do staff ROCKONBOARD desde o nascimento.

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