Demi Lovato leva rock para The Town e faz show digno de headliner

Foto: Diego Padilha
 
Sempre tive um encanto especial pela voz poderosíssima de Demi Lovato, especialmente após sua música "Anyone", de 2020 - um grito de socorro composto dias antes de sua overdose - que fala tão profunda e diretamente a ouvintes de várias gerações. E como amante do rock que sou, eu sonhava em ter aquela voz em uma de nossas fileiras. E assim aconteceu (só não ganho na loteria!). 

Parecia que o pop não mais satisfazia com purpurinas, coloridos e letras superficiais (NA-DA CON-TRA), e que Demi buscava algo mais denso e contundente, e o rock era o que podia dar vazão aos seus anseios questionadores.

Em 2022, a cantora traz ao Rock In Rio sua versão roqueira, e para surpresa de MUITOS roqueiros, foi uma das melhores apresentações daquela edição. No The Town, não foi muito diferente, exceto que, tanto por algumas alterações na postura, muito mais à vontade – enquanto em 2022 Demi inaugurava sua nova fase, naturalmente se percebia certas inseguranças, talvez por conta de seu fiel público, talvez pelo dia em que estava escalada, junto a Justin Bieber e afins (ela era estrela pop, lembra?), talvez até por conta de seus agentes, que sabemos tremerem no “mexer em time que está ganhando” – quanto pelos arranjos, que me pareceram mais pesados. O setlist não foi muito diferente, na real, mas a julgar pelos novos ares da cantora e sua banda (ainda fenomenal), era um outro show, de verdade, que estávamos vendo ali.

Demi, enfiada numa roupa preta estilosamente à prova de chuva (choveu um mundo em Interlagos), mostra a que veio logo, iniciando um review por quase toda a sua carreira e a sua transição. Empunhando uma guitarra e no palco espartano cantando "Confident", que em 2015 já tinha uma arranjo pesadinho, desta vez é apresentada em novíssima versão, com arranjo mais arrojado,e (re)lançada há poucos dias. Aliás, várias canções foram revistas para o seu próximo álbum, Revamped, que será lançado em meados de setembro.

"HOLY FVCK" veio logo na segunda canção, com o riff criativo de Nita Strauss, que já deixou de ser a ex-guitarrista de outros roqueiros, para ser a influência positivíssima de Demi na atual circunstância de sua jornada, assim, como a baterista Brittany Bowman, a baixista (e diretora musical de Demi) Leanne Bowes, e a tecladista Dani McGinley, que já deixaram de ser banda de apoio, para ser uma banda efetivada, mostrando um trabalho impecável, digno de aplausos de pé (e murros no ar, chifres na mão, etc).

"Swine", último single lançado, mostra o quê de punk rock que permeia o estado de espírito nesse novo trabalho, e que, curiosamente, casa bem com a voz de Demi, com arranjos vocais e instrumentais que animaram The Town, animaram a sala de casa de qualquer um que estivesse acompanhando o show, animaram o coração dessa aqui. Tivemos os momentos mais pop, claro, em respeito ao já citado fiel público de Demi, como "Substance" (2022) e a dobradinha "La La Land" / "Don’t Forget", ambas de 2008, entremeados por algumas palavras simpaticamente decoradas e enunciadas em português. “Vocês são fod4” eram algumas delas. O público delirou, claro.

Foto: Diego Padilha
 
Um momento para o último arroz de festa do Rock In Rio, Luísa Sonza, subir ao palco, igualmente protegida por uma capa de chuva, mas não contra a timidez que a assolou nas primeiras notas, sob um olhar atento de Demi, ao cantar "Penhasco2", single de Luiza feat Demi lançado há poucos dias e já batendo a marca de mais de 1 milhão de audições em apenas poucas horas. Passadas essas primeiras notas, talvez por dificuldades no retorno, Luísa se solta e faz sim, um belíssimo encontro com Demi. Houve quem achasse exagerado o dueto gritante, mas cara, Demi canta em notas altas o tempo quase todo, a Luísa mostrou ser capaz, essa era a hora, fio! Foi legal, sim. 

A seguir, a única balada da noite, "Skyscraper" (2011), é magistralmente tocada só em voz e piano por Demi (tá, o piano não é tão magistral, mas foi correto assim mesmo), hipnotizando o espectador com aquela goela incrivelmente potente, com um alcance que você tem CERTEZA (?) de que ela não chega, e ela bota na tua cara. 

Sobre as letras de Demi: elas são tocadas por uma carga emocional tão forte, ela é tão autobiográfica em suas canções, que dá pra ler um livro de sua vida, só ouvindo seus álbuns mais recentes. Ficamos tentando imaginar a quem ela se refere, se ela passou realmente por aquelas situações descritas, como em "29", assim como sabemos de "Skin Of My Teeth" fala de sua reabilitação clara e abertamente. É lindo e triste ao mesmo tempo, saber que essa menina de 31 anos já passou por muita coisa. O sofrimento é a lenha da fogueira do sucesso, sabemos, mas que bom que ela está achando a saída.

Fechando o show com a nova versão de "Cool For The Summer", Demi deixa o Palco Skyline mostrando que a organização do evento errou de novo, ao não escalar Demi Lovato como a grande headliner da noite. Porque não precisava mais nada para encerrar muito bem um belo dia de festival de rock.

Noemi Machado

Passou dos vinte há algum tempo, foi desencaminhada pelo Gênesis, Queen e Led Zeppelin ainda na infância e conviveu com bandas de rock a vida quase toda. Apresentadora do programa ARNews na Rádio Planet Rock e Rádio Oceânica FM, também é produtora de eventos, gestora do coletivo Arariboia Rock e colaboradora do site Rock On Board.

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