Discos: Mastodon (Emperor Of Sand)

Foto: Divulgação
Após tês anos sem gravar, Mastodon volta com disco temático
MASTODON
"Emperor Of Sand"
Reprise Records; 2017
Por Lucas Scaliza


Como a própria banda fez questão de deixar bem claro durante a campanha de expectativa para o álbum, o “Imperador de Areia” a que se refere o título é o câncer, essa doença que consome o paciente e o faz lutar pela vida, consumindo também as emoções de quem orbita a sua volta. E o tempo, às vezes, parece que escorre como areia de uma ampulheta. O quarteto americano do Mastodon recentemente viu isso ocorrer com amigos e familiares e decidiu abordar o assunto nas letras do temático Emperor Of Sand.

Como já de se esperar, o novo disco é um baile de bons riffs e aquela energia às vezes mais hard rock, como em “Show Yourself”, e que pode chegar ao metalcore com grande facilidade, sempre sabendo para onde voltar e sem nunca deixar o entusiasmo cair. A ênfase no ritmo, ditada pela bateria de Brann Dailor – um daqueles músicos que sabe se manter pontualmente no beat, fazer uma longa virada e voltar com perfeição ao ritmo regular – é chave para fazer dele uma experiências intensa.

Da primeira (“Sultan’s Curse”) à quarta música (“Steambreather”), ouvimos um Mastodon fazendo a lição de casa, colocando para fora o que já sabemos de que são capazes. Por melhor que Once More ‘Round The Sun (2014) possa ser, já era um disco em que se discutia como a fórmula da banda ainda dava certo, mas sem apostar em inovações. O caso é que Emperor Of Sand também pode ser visto dessa forma, e as três primeiras faixas só mantêm o que já sabemos sobre os músicos. “Steambreather” dá um vislumbre de como podem melhorar, e a partir da faixa seguinte vemos o Mastodon destilar toda a sua dor, peso e criatividade. Se o início foi mais do mesmo, da metade pra frente faz valer a posição no metal que ocupa atualmente.

“Root Remains” é o primeiro clássico de Emperor Of Sand. Início climático que desemboca em um ritmo intenso e arrastado com o vozeirão do baixista Troy Sanders mandando ver nos drives. Com um bom gosto incrível, conduzem a música para um desfecho mais emocional que é concluído com um maravilhoso solo de Brent Hinds. Sem brincadeira, é uma das melhores composições que o Mastodon já gravou. “Ancient Kingdom” é mais uma faixa em que Troy e Brann seguram a onda e deixam para Brent e Bill Kelliher variarem acordes, riffs e arpejos.

O que faz do Mastodon a banda de que todo mundo fala é a capacidade de fazer metal sem esconder as influências do hard rock, colocando as partes mais progressivas em comunhão com tudo isso, e não criando seções onde isso é jogado na cara do ouvinte. Talvez apenas “Andromeda” seja flagrantemente progressiva no disco, mas nada extremamente intrincado e ainda colocando um excelente aceno para o black metal no final. Ainda por cima conseguem temperar tudo com um clima meio psicodélico (“Clandestiny”), que é de onde vem toda a irreverência da banda, mesmo quando o som fala de algo tão grave e sério como o câncer.

E é claro que conseguem ser mais sombrios. “Scorpion Breath”, outra pérola do álbum, é o momento em que a banda se deixa chegar ao thrash metal para mostrar toda a perturbação da doença de que trata. E progressivamente, a excelente “Jaguar God” vai ficando mais pesada, mais emocional, indo da balada em 3/4 ao metal sombrio, passando por um solo totalmente técnico e voltando à valsa inicial para Hinds ter a oportunidade de celebrar a salvação na morte com mais um belo solo. Talvez não belo quanto o de “Root Remains”, mas ainda assim um que vale a pena parar para prestar atenção.

Emperor Of Sand é uma grande metáfora para a situação de um paciente de câncer, utilizando imagens e símbolos mitológicos e astrais para dar conta do assunto de forma narrativa. De forma alguma deixam a melancolia da situação tomar o som da banda. Pelo contrário: encontraram uma forma interessante de imaginar a situação, tomando uma postura realista mesmo dentro da fantasia, usando o problema como combustível para o peso e para os riffs. Não vai ser recebido como o melhor material do Mastodon, mas tem momentos que conseguem voar tão alto quanto os melhores da discografia.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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