Raimundos: "Os fãs são a nossa gravadora!"

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"Os fãs são a nossa gravadora!" 


Por Bruno Eduardo


Cantigas de Roda - o novo álbum dos Raimundos - chega para pontuar uma nova fase na carreira da banda [leia a resenha AQUI]. Afinal, esse é o primeiro trabalho de inéditas em doze anos. Financiado pelos fãs, a forma física do disco é distribuída como uma espécie de recompensa. "Hoje todo mundo quer o disco. Mas quando pedimos ajuda lá atrás, foram esses aí que ajudaram! É uma exclusividade dos fãs que nos apoiaram quando realmente precisamos!", afirmou Canisso. No mesmo ano em que a banda comemora duas décadas de seu debut, nada como constatar vitalidade em um trabalho cheio de energia, e com representatividade artística digna de sua história. Convictos, o grupo segue caminhada de forma independente, e encontra inspiração nos verdadeiros fãs para manter a chama acesa. Conversamos com o baixista Canisso, que falou sobre o novo disco dos Raimundos, e como foi recomeçar do zero. 



Particularmente falando, eu achei que o novo disco de vocês (Cantigas de Roda) traz uma sonoridade bem característica daquela época mais clássica, dos anos noventa. Gostaria de saber se houve essa preocupação por parte de vocês, em tentar resgatar isso.


Na verdade não tivemos nenhuma preocupação nesse sentido. A gente vem mantendo uma estratégia de recolocar o Raimundos na cena desde 2007. Então, era natural que quando parássemos para criar algo, iria sair alguma coisa nessa linha. Estamos tocando praticamente todos os fins de semana, desde 2007, por isso foi algo que aconteceu naturalmente. Nada intencional.


Inclusive, há algumas músicas no disco que trazem de volta aquela ligação com o lado nordestino, como por exemplo, "Gato da Rosinha".


Essa tenha sido talvez a única que nós utilizamos a fórmula antiga, propositalmente. O forrocore. A letra do Zenilton transformada no hardcore dos Raimundos. Essa foi a única que fizemos essa brincadeira.


Gostaria que você falasse da produção do disco, já que vocês gravaram com o Billy (Graziadei) do Biohazard. Como foi isso? Como vocês chegaram até ele?


Pois é cara. Tudo isso foi surgindo naturalmente. Quando nos juntamos para fazer o disco, nós não tínhamos ideia. Estávamos pensando em usar os meios de sempre, fazer tudo em casa, compondo e já editando. Nós fizemos uma pré muito trampada. Já estava tudo praticamente pronto. Só que aos 45 do segundo tempo nós encontramos um amigo nosso, o Binho Nunes, da banda Bife Killers, e quando ouvimos o trabalho dele - também mixado pelo Billy - nós vimos que o cara tinha dado um som bem legal no trampo dos caras. Além disso, o nosso baterista é fã do Biohazard. Sabe aquele fã de usar camiseta? É o Caio! Ele até tinha falado uma vez que sonhava em gravar um disco com o cara do Biohazard, e acabou caindo no colo. Sabe aquela coisa da mentalização positiva? Acho que foi isso. Aí o próprio Binho fez a ponte, e nós ficamos sabendo que Billy Graziadei não só conhecia os Raimundos, como curtia. Foi demais! 


Falando ainda sobre o Cantigas de Roda, tem uma música que eu curto muito, que é "Rafael". Afinal, ele existe? Esse Rafael é real?


Existe cara! Rafael é tipo vizinho da galera. Mora perto ali do Rodolfo [Abrantes, ex-vocalista dos Raimundos] e do Digão. Rafael é sobrinho do Manel, que também já foi citado em uma música nossa ("Véio, Manco e Gordo"). Manel é um cara lendário, mas o Rafael é o supra sumo da galera.


Fale um pouco sobre esse momento que vocês se encontram, em plano de distribuição fonográfica. No Cantigas de Roda vocês usaram o crowdfunding e lançaram o disco de forma independente. Só que o grupo já viveu o outro lado da moeda nos anos noventa, protegido por uma grande gravadora. Que analogia você faz dessas duas fases, e qual a principal vantagem em  lançar o trabalho por financiamento coletivo? 


Quando pensamos sobre crowdfunding, lá atrás, pensamos na forma que gostaríamos de registrar o CD. Porque compomos o CD nos nossos próprios home studios entre 2012 e 2013. Então o crowdfunding chegou para nos mostrar um caminho totalmente independente da gravadora. Porque a gravadora além de não dar a liberdade criativa - porque de certo modo ela interfere na sua obra - ela também ia dar uma mordida nesse nosso trabalho sem a garantia de uma divulgação em cima. É como entregar uma fatia do bolo já pronto, sem a garantia de retorno, entende? E esse era um disco crucial na nossa carreira. Porque é um disco para os fãs. E os fãs são os únicos responsáveis por manter a gente ainda na ativa. Eles é que definem a nossa relevância. Não estávamos preocupados com o mercado. Queríamos apenas o melhor registro possível para o nosso público. O crowdfunding era a melhor opção para conseguirmos ter total domínio nesse novo trabalho. O pior é que isso está nos causando um problema, já que todo mundo quer o disco (físico) e não tem mais. O disco físico é só para quem contribuiu. Ou seja, vai virar uma espécie de raridade. Podemos dizer que a nossa gravadora agora são os fãs!


E vocês não pensam em lançar o disco físico no futuro?


Esse disco não. A forma física dele, com encarte, incluindo os Vinis, só para quem contribuiu. É um edição limitada de fã. As músicas estão disponíveis na internet para download, pelo iTunes. Mesmo porque, nos tempos atuais pouca gente se interessa pelo disco físico. Só os fãs merecem esse material!


O fã de Raimundos tem um modelo específico? Você consegue enxergar o tipo de fã dos Raimundos? Pois houve uma mudança no fã clube de vocês, principalmente no início dos anos 00's.


O que eu sei é que verdadeiro fã dos Raimundos não curtiu tanto o Só No Forevis (lançado em 1999). O Só no Forevis é um disco totalmente mainstream. Consigo ver muito dos nossos fãs no Roda Viva. Porque ali está registrada a nossa qualidade de verdade. O nome "Roda Viva" é em homenagem as rodas punk dos nossos shows. Porque o nosso público é o das rodinhas. É o público que o mercado não quer. Eles querem o público das menininhas, do rebolado. Hoje em dia, nós somos os Raimundos dos fãs. Desse que se quebra nas rodas punk; que sai suado dos shows; que canta do início ao fim. Os Raimundos dos fãs é aquele do "Eu Quero Ver o Oco", "Bicharada", "Nega Jurema", "MM's".


Canisso, esse ano o primeiro disco de vocês completa duas décadas de lançamento. Vocês pensam em fazer algo à respeito?


É engraçado, porque em 2009 o disco completou 15 anos e a gente já estava tocando com essa mesma formação. Naquele ano, a gente fazia um show normal, saía do palco, e voltava tocando o primeiro disco na íntegra. Na época isso era importante para gente, porque era uma forma de mostrar para as pessoas que a nova formação estava coesa e não deixava a desejar em relação à original. Além disso, esse ano calhou de estarmos lançando o Cantigas de Roda. Não tínhamos mais como esperar. Tivemos que decidir se iríamos ficar mais um ano fazendo show de comemoração com essa formação ou tentar lançar coisa nova. Como já havíamos feito isso nos 15 anos do álbum (em 2009), a escolha natural foi mostrar a banda com novas músicas. Imagina se a gente passa mais um ano fazendo show flashback? Iríamos engrossar o coro de quem diz que vivemos do nosso passado. Eu até tenho vontade de gravar o primeiro disco todo acústico, na íntegra. Mas não é a nossa prioridade no momento. O Cantigas de Roda fica sendo nossa homenagem aos 20 anos do primeiro disco.


Na minha opinião, essa é a melhor formação do grupo desde que você voltou. Então queria que você falasse sobre o Caio, que é o novo baterista, e que entrou junto com você. E sobre a sua volta ao grupo.


O Caio tocava com o Digão na banda Dr. Madeira. Ele também era baterista de um grupo psychobilly, chamada Sapato Bicolores, e foi da Deceivers, que foi um expoente na cena de Brasília. Na época, eu era guitarrista de uma outra banda e acabei decidindo sair. O Digão já vinha me chamando para voltar ao grupo, mas eu tinha uma certa rusga com um integrante [o ex-baterista Fred], e por isso não aceitava. Só que numa noite específica, ele e o baixista da época não poderiam se apresentar e o Digão chamou eu e o Caio para tapar esse buraco.


Pelo visto funcionou, já que a banda cresceu muito, principalmente no palco.


Sim, eu lembro que o setlist era uma porcaria. Era tipo o lado A do Só no Forevis. Então decidimos incluir umas músicas mais porradas ali, e as rodinhas voltaram. Aquela foi uma turnê seminal para os Raimundos. Viajávamos os quatro e um técnico de som. Todo mundo rachando hotel, viajando de kombi. Aquela coisa bem tosca, sabe? De início de carreira. Lembro que na época tocamos em São Gonçalo (RJ), e ficamos num hotel de R$11 a diária. Ou seja, trouxemos a banda de volta na unha. É uma convivência que acabou se tornando inspiração para esse novo disco.


Por falar em convivência, como é a sua relação com o Rodolfo, hoje?


A minha relação com o Rodolfo é tipo aquela que você tem com um parente que você não vê há muito tempo. Nunca vai deixar de existir a admiração e a amizade. Só que a gente não tem mais nenhum contato.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

1 Comentários

  1. Meu Sonho Era ser o vocalista dos Raimundos, quando o Rodolfo largou a banda

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