Greta Van Fleet vai além de Led Zeppelin, soando muito mais nostálgico e cheio de referências

Com som similar, Greta Van Fleet já ganhou elogios do próprio Led Zeppelin
Por Lucas Scaliza

Como tudo nesta era, as reações ao Greta Van Fleet são extremadas: ou se considera a banda um hino ou um lixo. Não faltou quem ressaltasse como os garotos de Frankenmuth recuperam o rock sessenta e setentista para uma geração que já não conhece o rock. Também não era preciso procurar muito para ouvir ou ler comentários que tiravam sarro da banda por serem jovens “imitando” o Led Zeppelin e encontrar quem parecia ter raiva do grupo, sentindo que estavam usurpando o som de seu sagrado Zeppelin.

Na primeira vez em que discuti o Greta Van Fleet, mantive a posição de que esperaria até o segundo disco da banda para notar se ficariam presos à influência de Robert Plant, Jimmy Paige, John Bonham e John Paul Jones ou se teriam a garra de mostrar características próprias.

Bem, acho que o lançamento de Anthem Of The Peaceful Army deixa bem claro que o Greta Van Fleet tem raízes mais vastas do que apenas o sempre bom e velho Led Zeppelin. Estão muito mais alinhados ao classic rock, de forma geral, do que devotados inteiramente ao Led. “Age of Man”, que abre o disco, tem muito mais teclado que guitarra. “Brave New World”, já quase no fim do LP, tem algo de progressivo. Ambas, aos meus ouvidos, derivam muito de Rush. O The Who, que sempre foi uma referência forte para os irmãos Josh, Jake e Sam Kiszka, também dá as caras aqui e ali.

As raízes são vastas, cobrem bastante território musical ao que parece, mas não são profundas. Embora tentem não fazer faixas previsíveis – e eu me surpreendi com certas mudanças de ritmo e variações dinâmicas muito bem feitas -, não há nada que seja unicamente Greta Van Fleet em Anthem Of The Peaceful Army. Mesmo o Led Zeppelin, a grande inspiração e comparação do grupo, cometeu algumas liberdades que eram bem únicas para a época. É só lembrar do clima criado com “Dazed and Confused”. Ou então daquele miolo maluco de “Whole Lotta Love” que, além dos sons esquisitos, tinha a brincadeira de fazer o som ir de um lado a outro do seu equipamento de estéreo. Sem falar em todas as músicas épicas, longas e/ou cheias de detours, como “Black Dog”.

Canções novas do GVF como “The Cold Wind”, “When The Curtain Falls” e “Lover, Leaver” são totalmente alinhadas à tradição do rock do Zeppelin. Riffs espertos e ágeis, bases com ótimos grooves e vocal alto, cheio de drive, são onipresentes na receita e não os afastam da comparação com o quarteto inglês. Contudo, tenho que dizer que, inegavelmente, são boas canções.

O maior pecado do Greta Van Fleet é (ou continua a) ser a mais nova banda para se comparar com Plant & Cia. Já tivemos o Wolfmother, o The Black Crowes e o Rival Sons nessa mesma berlinda. As três bandas são excelentes e possuem discografias sólidas. É bobagem deixar de curti-las só porque podem derivar de Zeppelin. Pode também ser bobagem descartar o GVF pelo mesmo motivo.

A cozinha formada pelo baixista Sam Kiszka e pelo baterista Danny Wagner só não é melhor porque não exploram mais o formato das canções. Mas o que se prestam a fazer é de muito bom gosto. Ainda não dá para sacar qual seria o estilo próprio de Jake Kiszka para as seis cordas, mas se o negócio é emular Jimmy Page e Pete Townshend, ele o faz com grande sucesso. Até mesmo o timbre do instrumento está vintage o suficiente e às vezes até caipira o bastante para resgatar o passado. E o vocalista Josh Kiszka canta para impressionar ainda mais dessa vez. Não tem o charme e aquele senso de imprevisibilidade que muitas vezes Robert Plant tinha (em estúdio e ao vivo), um sinal de tempos em que as bandas são mais comportadas e embaladas desde cedo como um produto confiável.

Dá para a banda recuperar tudo do rock clássico: os timbres de Fender, os riffs, os teclados e, com Josh na parada, até os vocais incríveis de um Plant. Mas não recuperam a atitude rock’n’roll fundamental de Led Zeppelin, Black Sabbath, The Who, etc. Era essa atitude que determinava muito do que seria o som, e não o contrário.

O que fica de Anthem Of The Peaceful Army é uma execução muito boa, mas originalidade muito aquém. Para certo público, que já não consegue mais ouvir nada que não seja familiar, é ótimo que o Greta Van Fleet não invente muita história. A crítica da Pitchfork foi cruel com a banda e o disco, mas acertou em cheio ao dizer que hoje, na era dos streamings e algorítimos de indicação musical, quanto mais único é seu som, mais difícil relacioná-lo com algo que o público já ouve. O Greta está bem coberto nessa área, já que é associado a uma das maiores bandas que o planeta já viu e é só a nova ponta de uma longa tradição de bandas que soam como o Zeppelin para roqueiros notálgicos baterem palma ou para roqueiros preciosistas reclamarem.
Cotação:

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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