Em 2001, o Pato Fu estreou no Rock in Rio, com a tarefa de abrir o Palco Mundo e encarar uma multidão sedenta por Guns N'Roses. O show da banda foi tão legal, que é lembrado até hoje pelos fãs mais antigos, e por quem estava lá. No entanto, o grupo nunca mais voltou a se apresentar na edição brasileira do festival e agora comemora 30 anos de carreira, em shows que rodaram o país inteiro. Mas, como eles estariam encarando esse retorno ao Rock in Rio, tanto tempo depois daquele fatídico 14 de janeiro de 2001? John Ulhoa, Fernanda Takai e Ricardo Koctus falaram ao Rock On Board sobre o assunto.
"É um momento muito diferente de ter tocado naquela época né? Apesar de ali a gente já ter quase dez anos de estrada, a gente ainda tinha aquela sensação de ter que entrar e se afirmar como banda e tal, numa noite de Guns N'Roses. Hoje em dia é mais uma sensação de celebração e de valorização de uma geração que tem a gente, tem a Penélope, que a gente vai inclusive fazer um show com eles no dia 14", afirmou John Ulhoa.
"E acaba que naquela época, a gente ainda tinha uma força muito grande da própria indústria fonográfica. Então a gente ainda estava em rádio, tocando demais. A gente estava numa situação muito diferente de hoje", diz Koctus.
Koctus tem razão. Em 2001, o Pato Fu divulgava o excelente Ruído Rosa, um dos álbuns mais elogiados por crítica e fãs da banda, e que tem sucessos radiofônicos como "Eu", "Menti Pra Você, Mas Foi Sem Querer", e uma versão badalada dos Mutantes para "Ando Meio Desligado". Sem essa força das rádios nos dias de hoje, que eram uma espécie de guia para os ouvintes ao que surgia de novo no mercado, os festivais acabam sendo uma boa saída.
"Hoje as pessoas tem que pesquisar para te descobrir. As redes sociais e os streaming e a questão da mudança da indústria, ela de certa forma facilitou para você buscar, mas de uma grande maneira pulverizou demais. Tem muita coisa, e as pessoas têm que ter interesse em pesquisar. E num ganho geral, a impressão que eu tenho é que a maior parte do público não pesquisa tanto. Mas quando você está num grande festival, você tem essa oportunidade de apresentar suas músicas para uma galera que você não atingiu ainda", completa Ricardo Koctus.
Show exclusivo no Rock in Rio
No dia 14 de setembro, o Pato Fu se apresenta no Rock in Rio e terá como convidados, a banda Penélope, de Érika Martins. A Penélope também se apresentou na icônica edição de 2001, e agora retorna ao festival para um show, que de acordo com a galera do Pato Fu, será único.
"É um desafio de montar um show, que a princípio vai acontecer só ali, num palco de encontros que é o Sunset. Então tem esse sabor de a gente realmente não saber qual vai ser a reação da plateia. Só que ao mesmo tempo, tem uma sensação mais relaxada de saber que é um show celebrativo", diz Ulhoa
Takai reafirma o ineditismo da apresentação e diz que embora a banda vá tocar alguns clássicos, é um show pensado para esse formato com a Penélope no Rock in Rio.
"É um show exclusivo. Então ele nunca foi feito. É um show que tá sendo feito para o Palco Sunset, para esse momento. Apesar das bandas já terem uma convivência, de eu ser amiga da Érika (Martins, da Penélope), mas esse show, ele vai ser visto pela primeira vez. A gente vai executá-lo assim, pela primeira vez, depois desses ensaios aqui em Belo Horizonte. Eu acho isso muito desafiador. De uma banda querer fazer isso, e não querer chegar e pensar assim: "vamos tocar só as nossas músicas conhecidas". E não é isso. Estarão músicas conhecidas do Pato Fu e da Penélope, mas tem músicas que a gente vai tocar juntas que o público vai pensar "nossa". São escolhas que a gente tem que fazer às vezes para o público, que é a escolha não óbvia" - Diz Takai
A ideia do Palco Sunset em casar artistas, agrada ao baixista do Pato Fu, que promete um show que não vai ser como um "jam sessions".
"O Palco Sunset por si só tem essa característica de trazer junções, convidados... Essa ideia do Palco Sunset é uma sacada. E óbvio, nós como Pato Fu, a gente quer chegar lá com uma coisa diferente, e não só fazer uma jam sessions", disse Koctus.
"Rock in Rio é um carimbo o currículo"
Já em 1985, na primeira edição do Rock in Rio, algumas das principais bandas de rock nacional daquela geração acabou ganhando uma chancela importante do festival. Na edição do Pato Fu, em 2001, não foi diferente. Basta lembrar da famosa "Tenda Brasil", que reuniu gente como Tianastácia, Pavilhão 9, Los Hermanos, Nação Zumbi, Tihuana e Autoramas, todas cheias de gás. Mas nos tempos atuais, ainda é importante para uma banda veterana tocar no festival?
"Qualquer banda que passe pelo Rock in Rio, traz um carimbo legal. É currículo. Se você pensar como um médico, tudo o que ele faz de trabalho, de investimento, de estudo, é agregado ao currículo. No caso de um artista, participar uma vez do Rock in Rio é incrível. Participar duas vezes, dez vezes, mostra cada vez mais que você é interessante para o público e para o próprio festival. Então, pra mim, ter no meu currículo hoje que toquei duas vezes no Rock in Rio com um Grammy Latino, é muito importante. E o Rock in Rio é um festival de muita importância. Tem 40 anos", diz Koctus.
30 anos de estrada, mas ainda inquietos
O Pato Fu sempre foi uma banda sedenta por criar coisas novas. Misturaram o seu rock alternativo com uma pá de coisas e nunca pararam de gravar discos. Com isso criaram uma legião de fãs das mais fiéis que se tem notícia, e que foi se reformulando com tempo. Por isso, até hoje é difícil estereotipar um fã da banda pelas diferentes fases criativas ao longo da carreira. Ulhoa dá sua visão sobre essa atual fase do grupo, comemorando três décadas de estrada, e explica a relação do Pato Fu com o seu público e com a música.
"Vai ter gente que conhece os hits do Pato Fu, vai ter gente que é fã das antigas. A gente tá sempre produzindo músicas novas também. A gente tem vontade de fazer músicas novas. Fazer algo que ainda seja relevante, novo. Esse é o maior desafio das bandas mais antigas, que é não ficar só refém da nostalgia", disse Ulhoa.
A verdade é que o Pato Fu acaba sendo uma banda sobrevivente das mutações imprevisíveis e nebulosas que o mercado fonográfico sofreu até chegar hoje, nos streamings. Fernanda Takai, inclusive, acredita que o grupo viveu o pior momento da indústria, que foi a transição para os mp3, onde as vendas despencaram com os chamados "CDs Piratas".
"A gente viveu o pior momento, que foi quando o mp3 apareceu e que a pirataria de rua no Brasil era o que mais matava a venda de discos, né? Porque quase ninguém tinha computador no Brasil e a inclusão digital aconteceu quase depois disso. A gente começou pelo vinil, fita k-7, passou pelo CD, aí veio o mp3 e a indústria se desmanchou toda, e hoje a venda é digital", Diz Takai.
Em 2016, em entrevista aqui para o Rock On Board, John Ulhoa afirmou que o mercado ainda não estava pronto e que os streamings pagavam "uma merrequinha". Passados oito anos dessa entrevista, questionamos o guitarrista sobre o que evoluiu até então.
"O streaming vem melhorando. Obviamente é uma indústria milionária. Eu acho que ainda não está totalmente pronto, no sentido de indústria que sustentava carreiras, como era na época das gravadoras. As gravadoras tinham um monte de problemas, mas era de uma certa maneira uma indústria que investia nas carreiras. Mas é um universo que parece distante hoje em dia. Até a maneira de se produzir música hoje é diferente. Uma galera produz música em um quarto de hotel. Eu acho que essa justiça econômica desse modelo, está sendo construída ainda. Mas, o que posso dizer, é que ele ainda é mais deficitário do que na época das grandes gravadoras", finalizou.