Bruce Dickinson comprova força de carreira solo com ótimo show no Rio

Foto: Adriana Vieira / Rock On Board

Horas antes do show, camisas pretas (a maioria com estampas do Iron Maiden) invadiam o Shopping Via Parque, local onde fica localizado o Qualistage - casa de shows, que um dia teve o nome de Metropolitan. E curiosamente, foi exatamente lá, no eterno Metropolitan, em 1999, que Bruce Dickinson fez o seu último show no Brasil apresentando o repertório de sua ótima carreira solo. 

Para quem não sabe, Bruce largou o Iron Maiden no início dos anos noventa para se aventurar num projeto dele. Em seu primeiro disco fora da icônica banda (Balls To Picasso), ele já conquistou uma legião de fãs na época por conta de um hit radiofônico e lançou mais três álbuns nos anos seguintes - com destaque para dois petardos sonoros tão impressionantes (Accident Of BirthChemical Wedding) que abafaram a relevância do próprio Maiden no final daquela década.

Aliás, vale lembrar que naquela época totalmente solo, Bruce Dickinson teve a companhia de Adrian Smith, o que fez muito fã da Donzela - que não curtia muito os trabalhos com Blaze Bayley - a abandonar um pouco a paixão antiga para começar um novo relacionamento de devoção. No entanto, o retorno ao Iron Maiden fez com que Bruce engavetasse o projeto, a ponto de ficar - de forma inexplicável e imperdoável - mais de vinte anos sem fazer uma única apresentação com essas canções. 

Mas, como diziam os sábios, muita água passou debaixo dessa ponte. E hoje, motivado pelo lançamento de um novo disco, Dickinson chega ao Brasil para uma série de shows, que além de relembrar os melhores momentos de sua carreira fora do Maiden, serve também para dar gás numa empreitada que envolve música, quadrinhos, entretenimento e aquela velha inclinação dos artistas veteranos para uma independência artística de terceira idade. 

Com uma banda escolhida a dedo, e com alguns novos companheiros de estrada (como a baixista Tanya O’Callaghan e o baterista Dave Moreno), Bruce não só passa a impressão de que é movido por aquela empolgação juvenil, como também trata de comprovar que está a mil por hora em todos os sentidos. Para ter uma ideia, vale lembrar que o cara estava aqui no Brasil há bem pouco tempo, tocando com uma orquestra, e que no final do ano retorna para shows com o Iron Maiden. 

Show no Rio traz saudosismo sem tocar Iron Maiden

Foto: Adriana Vieira / Rock On Board

Após uma pequena introdução, o show começa com o pé na porta. "Accident Of Birth", faixa-título de seu álbum solo mais icônico - aquele que tem o palhacinho na capa (estampado inclusive em muitas camisas no local) -, já fez o povo da grade cantar alto o refrão. Já na primeira canção, deu para notar as credenciais que mantém esse senhor de 65 anos ainda como um dos maiores vocalistas de heavy metal em todos os tempos. 

Mesmo cantando em tom abaixo (natural para sua idade e para sua técnica), ele demonstra potência invejável e um alcance raro até mesmo para cantores bem mais jovens. "Bruce é um alienígena", disse um fã na plateia. Talvez seja mesmo. Essa fama de E.T. até que combina com a imagem do telão de um Disco Voador em processo de abdução, em "Abduction", ótima canção do novo trabalho.

Por falar no novo disco, The Mandrake Project funciona muito bem ao vivo. "Resurrection Men", por exemplo, tem aquele refrão com a marca registrada de Dickinson, com título cantado quase forma operística. Já "Rain On The Graves", com imagens sombrias sendo exibidas no telão, é acompanhada de palmas e um refrão pesadão do eficiente Philip Näslund.

Mas são nas canções das antigas que a casa vem na onda. "Laughing In The Hiding Bush", presença curiosa mas bem selecionada, de Balls To Picasso, botou a galera para pular, e "Chemical Wedding", faixa-título do melhor disco solo de Bruce Dickinson até hoje, teve seu refrão gritado no mais alto volume possível pela plateia - que inclusive, voltou a cantar esse mesmo refrão no final do show, em "The Alchemist", um fechamento do álbum lançado em 1998. A catarse popular chegou ao seu ápice no superhit "Tears Of The Dragon", que segue sendo um dos mais bonitos 'rock balads' dos anos noventa - inclusive desbancando muitas bandas hard rock naquela geração.

Foto: Adriana Vieira / Rock On Board
 
Mas o melhor tinha ficado para o final. O riff levanta-defunto de "Darkside Of Aquarius", talvez o maior supra-sumo heavy metal cantando por Bruce nos últimos 30 anos, reuniu coro dos fãs na introdução quase à capela e descambou numa 'bateção' de cabeça generalizada entre os presentes. Outra que disputa esse posto de melhor epopeia peso-pesado de Bruce Dickinson é "Book Of Thel", que veio logo depois. Aliás, essas duas canções deveriam ser oficializadas como catálogo necessário para qualquer nova banda de heavy metal no mundo. 

Fechando o show, "The Tower", que soou como um hit clássico do Iron Maiden, tamanha a força de resposta dos fãs, que cantaram palavra por palavra, como se fosse a última canção do mundo. Nessa, podemos dizer que Adrian Smith e Roy Z fizeram falta, já que as guitarras fraseadas soaram um pouco irreconhecíveis na introdução.

A verdade é que esse show de Bruce Dickinson veio para estabelecer o quão necessária é - e foi - a sua obra solo para os fãs de heavy metal, e também comprova a força de um repertório sensacional. A maior prova disso, é que ele não precisou tocar qualquer coisa de Iron Maiden neste show para agradar o público. E o que mais impressiona - ou não - é que ao contrário do que aconteceu naquele fatídico show de 1999, dessa vez, os gritos de "Maiden, Maiden" foram substituídos por um "Olê, olê Bruce, Bruce!". Isso sim, é o que chamamos de justiça sendo feita!

Pode voltar quantas vezes quiser, Sr. Dickinson.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem
SOM-NA-CAIXA-2