Homegrown
⭐⭐⭐✰✰ 3/5
Por Marcelo Alves
A
dor de um amor perdido está entre os sentimentos universais que unem todos os
artistas. E todos os seres humanos, é claro. De Marília Mendonça a Neil Young,
todo cantor há de ter o seu momento de sofrência na carreira. A diferença
parece estar no momento em que o artista resolve exorcizar seus fantasmas. Para
o cantor canadense, demorou um tempo. Mais especificamente, quatro décadas e
meia. Mas nunca é tarde para abrir o coração e o baú de canções antigas para
lançar um álbum e se manter produtivo durante a pandemia de coronavírus.
Lançado
no mês passado, Homegrown entrará na carreira de Neil Young como o seu 40º
álbum de estúdio, mas, na verdade, poderia ter sido o sexto disco de um artista
ainda vivendo a primeira década de sua carreira. Contudo, uma série de circunstâncias
e, entre elas, um momento especialmente prolífico de sua carreira, levaram
Young a engavetar o disco que só ganhou a luz do dia neste ano de 2020.
Musicalmente,
o que vemos em Homegrown é um Neil Young minimalista. Canções curtas, algumas
com letras bem curtas (duas, três estrofes), e um cantor usando basicamente a
sua guitarra, o seu violão e sua gaita para cantar as dores do amor. Sim,
porque tematicamente as músicas do álbum permeiam as dores de um amor perdido.
As
canções de Homegrown foram originalmente gravadas entre 1974 e 1975, após,
portanto, o lançamento de “On the Beach” e antes das sessões de gravação para o
álbum Zuma, sétimo disco de estúdio de Young. Naquela época, Young estava tão
produtivo que chegou a gravar dois álbuns. Mas optou por lançar Tonight's the
Night (1975), pois via “fraquezas” no repertório de “Homegrown”.
Na
ocasião, o cantor estava vivendo o fim de um relacionamento de cinco anos com a
atriz Carrie Snodgress, que faleceu em 2004 e ficou mais conhecida pelo seu
trabalho em “Quando nem um amante resolve” (No original, “Diary of a Mad
Housewife”, 1970). Young chegou a escrever para ela a canção “A man needs a
maid”, que entrou no álbum Harvest (1972) e faz referência ao filme pelo qual
a atriz ganhou dois Globos de Ouro e foi indicada ao Oscar. A letra de “a man
needs a maid” não poderia ser mais direta: “I was watching a movie with a
friend/I fell in love with the actress/She was playing a part that I could
understand”.
Mas
em 1974, quando as canções de “Homegrown” estavam sendo feitas a relação já estava
se deteriorando. Vemos aqui um Neil Young com letras melancólicas, falando
sobre as suas inseguranças, o fim da relação e se despedindo de Snodgress em
trechos como os de “Separate ways”, em que Young cita, inclusive, o filho Zeke,
que teve junto com a então mulher (We go our separate ways/Lookin´for better
days/Sharin´our little boy/Who grew from joy back then”).
“Separate
ways” é uma das destaques do disco, junto com “Try”, “Love is a rose”, “White
Line” e “Star of a Bethlem”. E todas elas giram em torno das angústias,
inseguranças e do fracasso de relação. O que pode ser vistos em trechos como
este de “Try”: “I´d like to take a chance/But shit, Mary, I can´t dance/So
here´s to lookin´ up your old address/Holly what a mess/We gotta take the rest
and try”.
Em
“White Line”, Young fala da dor da perda da mulher em versos como “You were my
raft/And I let you slide/It seemed like such a/Long easy ride/I was adrift/On a
river of pride/Feels like a railroad/I pull a whole load behind me”. Tom que é
mantido em “Love is a rose”, que tem uma bela introdução de gaita. “Love is a rose
but you better not pick it/only grows when it´s on the vine/handfull a thorns
and you know you´ve missed it/lose your love when you say the world mine”.
Homegrown segue quase sempre no mesmo tom. Excetuando-se, talvez, a faixa-título, que
abre com um solo de guitarra, e na ótima “Vacancy”, que sobe um pouco o tom com
uma pegada de guitarra mais forte, mas mantém a sofrência que permeia o álbum
em trechos como “Are you my friend? Are you my enemy?/Can we pretend to live in
harmony?/You come through the weirdest way/You copy her with the words that you
say/I need that girl like the night needs the day/I don´t need you getting in
my way”.
Nem
todas as canções de Homegrown permaneceram escondidas por mais de 40 anos.
Algumas já foram tocadas em shows de Young, como “Mexico”, “Try” e “Separate
ways”, mas esta é a primeira vez que vemos a compilação destas canções dentro
de um álbum e no contexto e conceito ao qual elas supostamente deviam servir. E
não deixa de ser interessante ver Neil Young exorcizando as antigas dores tanto
tempo depois.
Homegrown pode não ser um álbum brilhante, mas está longe de ser aquela sobra de estúdios
caça-níquel sem relevância. Pelo contrário. É um álbum que tem um DNA muito
forte de Neil Young e com potencial para agradar os fãs do longevo cantor
canadense.
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