Discos: Kapitu (Vermelho)

Foto: Kapitu / Vermelho

KAPITU

Vermelho

Independente; 2015

Por Bruno Eduardo


Vermelho pode ser considerado mais um capítulo de sucesso do chamado financiamento coletivo - o crowdfunding. Pegando carona numa tendência que vem ajudando diretamente as bandas independentes, a Kapitu decidiu colher os frutos de sua crescente legião de seguidores para produzir seu segundo disco de estúdio.
    
Após ser concebido no Rio de Janeiro com a ajuda do ex-Planet Hemp, Pedro Garcia, o trabalho viajou até Seattle para ganhar o polimento de Chris Hanzsek - produtor cultuado por ter trabalhado com bandas no embrião do grunge, como Soundgarden, Melvins e Green River. E antes que alguém pergunte se esse disco tem algo a ver com o rock sujo das bandas citadas acima, eu respondo: Não.

"Pra Nunca Te Deixar", faixa que abre o disco, é até capaz de enganar alguns roqueiros mais ansiosos. Guiada por um riff de guitarra levanta-defunto (desses que estão em extinção nos dias de hoje) e um refrão rasgado, a canção pode ser considerada um hard rock top padrão. No entanto, é bom avisar que o disco não segue esse caminho. Mesmo que "Apenas Diferente", que vem em seguida, também se equilibre nas ondas do rock - com suingue e guitarras muito bem tramadas - a seqüência do álbum se transforma em uma busca incessante por riquezas melódicas e feeling - muito feelingSendo assim, a distorção se torna uma opção, e para um bom entendedor, pingo é letra. 

Porém, é sempre bom ressaltar que a Kapitu não é daquelas bandas que demonstrem em sua música uma necessidade de mudar o mundo. Não possuem a pretensão tecnológica que assola a maioria das bandas descoladas - que utilizam efeitos em demasia - e nem são entupidos de engajamento juvenil, cheio de discursos moralistas / politizados. Para eles, o que interessa é tirar o máximo de seus instrumentos, buscar escalas alternadas, e falar sobre sentimentos que rasgam o peito. Ou seja: na cartilha básica do rock, a Kapitu não transpira como punk, mas inspira como arte. E é exatamente por isso que a audição deste disco se faz tão urgente nos dias de hoje. 

Vermelho é fundamentalmente movido por dois ingredientes particulares: o tesão e a paixão. Matemática simples para o amor perfeito. Na música da banda acontece o mesmo. Quando a coisa pega fogo, guitarras cheias de pressão aparecem em forma de rock and roll genuíno, que bebe nas águas de bandas como Pearl Jam e Led Zeppelin. A visceral "Canções Vazias" é o ápice da brasa. Já a influência noventista aparece em "O Impossível", que possui aquela explosão hard típica de um Foo Fighters. No entanto, a grande fração do disco é carregada pelo sentimento mais brando, com espasmos de angústia em alguns pontos isolados. Um grande exemplo dessa espécie de 'rock macio' que a Kapitu apresenta em 'Vermelho' é a excelente "Nunca Mais Do Que A Você", um âmago de melodias escondidas - como solos de baixo, notas de teclado oscilantes e vozes particulares. A finura técnica da banda vem representada pelas baquetas do habilidoso Rafael Marcolino, que dá um show de bateria - com levadas abertas e viradas cerebrais (ouça "A Busca", e comprove). Nesse disco, a voz de Yuri Corbal também se desgarra um pouco da Frejatização que o persegue desde o debut da banda, Utopia (2013) - e brilha em quase todas as canções. Principalmente no supra-sumo final, uma viagem exuberante de seis minutos - repleta de teclados, solos de guitarra blues estonteantes e coral de vozes - batizada de "Mais Leve".

Para quem também acha - ou achava - que a Kapitu tem influências de Barão Vermelho, ou curte a banda por essa similaridade, um conselho: menos Barão, mais "Vermelho". Seguindo este trocadilho, você estará prestando um enorme favor ao futuro do rock nacional.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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