Discos: Cachorro Grande (Electromod)

Foto: Divulgação
Cachorro Grande investe pesado no eletrônico mas escorrega no contexto
CACHORRO GRANDE
'Electromod'
Coqueiro Verde; 2016
Por Lucas Scaliza



O flerte entre o rock’n’roll e o eletrônico não é novo. Pense no New Order da década de 1980 e no de hoje. Pense também no Garbage de ontem e de hoje. Depeche Mode vêm à mente. E quem sabe a banda paulistana Remove Silence? O Muse é um power trio com pegada roqueira e timbres eletrônicos. Chris Cornell deixou o grunge do Soundgarden de lado para fazer um eletrônico bem interessante na carreira solo. E até mesmo Mark Lanegan, do Screaming Trees, resolveu investir nisso e obteve resultados interessantes. E nem vamos falar de tudo o que David Bowie já fez…

No Brasil é bem mais difícil encontrar uma banda de rock orgânico que flerte com o eletrônico, ainda mais quando o som orgânico é tão característico desde o início da discografia. Mas a banda gaúcha Cachorro Grande resolveu arriscar e trouxe os timbres eletrônicos para a frente da produção de Electromod, oitavo disco de inéditas do catálogo. Se não fosse por algumas características do grupo (a voz do vocalista Beto Bruno, uma pegada psicodélica e o ritmo afoito de algumas faixas mais ágeis) seria um som quase irreconhecível.

Ouvir "Tarântula", "Nem Tudo É Mais Como Era Antes" e a primeira metade de "Pandora" é quase um choque. No lugar de uma bateria cheia de pegada temos batidas eletrônicas; no lugar de riff de guitarra, sons saturados produzidos por sintetizadores ou linhas melódicas feitas por teclados.

Mas calma. Electromod não é um disco que parece atestar que a banda mudou seu rumo musical, como se a partir de agora o Cachorro Grande deixasse de ser uma banda e passasse a ser um grupo de produtores de música eletrônica. O álbum está mais para um experimento na discografia e a chance de poderem se desafiar como artistas.

A maioria das faixas apresenta o Cachorro Grande enquanto banda mesmo – vocal, bateria, guitarra e baixo – enquanto o som é complementado por sons eletrônicos e viajantes comandados principalmente por Pedro Pelotas. Dessa forma, a dinâmica da banda mantém-se presente o tempo todo. "Limpol no Astral", uma das melhores músicas do álbum, é tão psicodélica quanto clubber. Rodolfo Krieger faz uma das linhas de baixo mais marcantes do álbum e Marcelo Gross faz um solo bastante radical no final, sem falar no excelente uso do pedal wah-wah. Outra faixa de destaque é "De Longe Todo Mundo É Normal", com uma performance notável de Krieger e Pelotas mais uma vez.

"Eu Sei Que Vai Feder", "Subir É Fácil, Difícil é Descer" e "Arpoador" (esta com uma participação expressiva da guitarra de Gross) dão conta de mostrar que a estrutura de composição do Cachorro Grande ainda é bastante calcada no pop rock. Ainda que as faixas possam ter sido pensadas como puxadas pelo eletrônico, no final é como uma banda comum acrescentando arranjos de sintetizador, teclado e programação eletrônica. 

Difícil saber se o público que acompanha o Cachorro Grande vai se dar bem com a proposta de Electromod, mas não há nada muito fora do lugar. Eles não entraram de cabeça nessa onda e nem tentaram maquiar os sintetizadores e as programações para soar como uma banda mesmo, como fez Mark Lanegan. Contudo, estão evidenciando bem mais a presença do eletrônico do que em Costa do Marfim (2015). Talvez a grande escorregada da banda ocorre na música que dá nome ao álbum - onde numa tentativa de, talvez, soar politizado em uma época de crise, o grupo gravou uma letra cheia de versos mal escolhidos e que achatam uma situação política mais do que complexa. 

Musicalmente falando, não é preciso mergulhar fundo para saber que o estilão da banda continua presente em Electromod. O problema é que as novidades sonoras não refletem um novo jeito de pensar e nem trazem um frescor tão grande assim à obra do grupo.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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