Cigar Box Band
Don't Belong
⭐⭐⭐⭐✰4/5
Por Ricardo Cachorrão Flávio
Formado em 2021 em Belo Horizonte, o trio mineiro CIGAR BOX
BAND, formado por Germano Renan, vocal, Fred Chamone, na curiosa cigar box guitar
e Paulo Espinha, na bateria, estão prestes a mostrar ao mundo o seu primeiro
álbum: “Don’t Belong”, um petardo que mistura em doses certas muito blues,
country e hard rock, nos brindando com um trabalho visceral, onde as influências
de ZZ Top, Led Zeppelin e Seasick Steve são sentidas em meio a características
próprias e marcantes, lançado pela gravadora francesa M&O Music – em todas
as plataformas de streaming a partir de 16 de fevereiro.
Como diz o nome da banda, o trabalho deles é centrado na
curiosa cigar box guitar, um instrumento considerado um ancestral da guitarra
elétrica, construído artesanalmente com componentes simples, mas capaz de
produzir inúmeros sons diferentes e empolgantes. A sua origem, como diz o nome “cigar
box”, vem de antigos instrumentos de cordas produzidos com caixas semelhantes a
caixas de charutos, que eram feitas com uma fina camada de madeira, e não
tinham um padrão específico, podendo ter vários tamanhos e duas ou quatro
cordas em seu princípio. Popularizou-se durante os anos 1930, época da grande
depressão norte-americana, quando a importação de matéria prima para construção
de instrumentos era escassa e se usavam da criatividade e do que se tinha a
mão, como isqueiros, arames e caixas de charutos, que começaram ser
comercializados em caixas de madeira a partir de 1840, que foi quando esse
instrumento passou a ser produzido.
Conta-se que a cigar box guitar foi o primeiro instrumento
do icônico bluesman Blind Willie Johnson, que construiu a sua com suas próprias
mãos, e também era utilizada por Billy Gibbons, guitarrista do grande ZZ Top. Muitos
músicos contemporâneos têm ressuscitado o interesse por esse instrumento
singular, explorando suas possibilidades sonoras e incorporando-o em suas
performances, como é o caso de Jack White, Seasick Steve, PJ Harvey, Ben Harper
e Shane Speal. Até Sir Paul McCartney já apareceu dedilhando uma cigar box
guitar no documentário Sound City (2013).
"Don't Belong" é resultado de uma longa jornada,
conforme conta Chamone: "O processo
de composição e gravação foi bastante intuitivo e colaborativo. Primeiro, os
riffs e estruturas harmônicas criados por mim se mesclaram às partes melódicas
e letras autobiográficas compostas pelo Germano. No estúdio, as canções foram
ganhando forma muitas vezes na base da improvisação, seguindo a tradição
blueseira. A versatilidade e precisão rítmica do Paulo foram ingredientes
fundamentais para que conseguíssemos chegar onde queríamos. E ainda, tivemos o
privilégio de contar com a participação especial de dois grandes músicos:
Eduardo Sanna (gaita) e Luciano Porto (contrabaixo)".
As gravações ocorreram no Studio Independente em Belo
Horizonte, com produção e mixagem de Fred Chamone. A masterização foi realizada
na Espanha, no FD Mastering Studio, por Fernando Delgado.
Como informado no bem detalhado release da banda,
no álbum, foram utilizados três tipos de cigar box guitar, cada uma com
características e afinação diferentes, além de uma guitarra elétrica
convencional. O modelo que mais se destaca no arsenal é a cigar box guitar
construída com uma pá. O instrumento produz uma distorção brutal capaz de criar
ondas sonoras sísmicas e pode ser apreciado no clipe de "Be Mine",
single divulgado em janeiro, que pode ser visto abaixo:Ainda segundo o release da rapaziada, com o lançamento de
"Don't Belong", a Cigar Box Band busca integrar definitivamente a
cena do rock brasileiro enquanto almeja estabelecer uma carreira
internacional. O grupo está determinado a construir uma base sólida,
explorando novos horizontes e conectando-se com audiências ao redor do mundo. E
o que eu posso dizer sobre isso, é que estão no caminho certo.
O álbum é composto de sete faixas, abrindo com o single “Be Mine”,
um blues seco, direto e pesado, que conta com a participação de Luciano Porto
no contrabaixo, mas o destaque é mesmo a cigar box guitar, com slide potente e
viciante. Fred Chamone, que assume
também a função de produtor, compartilha detalhes interessantes sobre o
equipamento: “O corpo e o braço são uma pá. Captador, tarraxas e cordas são de guitarra
mesmo. Eu uso uma afinação aberta para poder tocar com slide. Aliás, eu só uso
slide feito de latão porque acho que desliza melhor. A combinação de todos
esses elementos resulta nesse timbre brutal”.
O disco continua com “Don’t You Believe”, um country
blues caprichado, onde Fred Chamone deixa de lado a cigar box guitar, e manda
ver um slide caprichado numa guitarra convencional, e também faz o baixo na
gravação. A banda já havia divulgado um clipe desse som ano passado, e aqui
conta com a participação de Eduardo Sanna, na gaita.
“A Lot of Times” começa com um riff vigoroso da cigar box, tem
bateria marcante, possui solos de gaita bem colocados e vocal arrastado que vai
num crescente e casa muito bem com o conjunto da obra. A quarta música do álbum
é a faixa título, “Don’t Belong”, bluesão clássico, onde já me imaginei no
balcão empoeirado de um bar de beira de estrada, pedindo um Bourbon duplo sem gelo.
Direto e sem frescuras.
O álbum continua com “I Wasn’t Wrong”, uma faixa mais rock’n’roll
e, em contraponto, a sequência vem com uma bela balada, “Everything”, talvez a
mais bonita canção do álbum, que contém climas viajantes, com Fred Chamone
mostrando sua qualidade como multi-instrumentista, aqui mandando ver na
guitarra havaiana / lap steel e no mellotron – um teclado eletrônico, que gera
seu som a partir de fitas pré-gravadas.
E chegamos ao fim da jornada com outro blues daqueles que diz a
que veio: “Turn the Stone”, com participação novamente de Luciano Porto no
baixo e Eduardo Sanna na gaita, com Fred Chamone na guitarra e também fazendo
algumas linhas de baixo, levada de bateria na medida por Paulo Espinha e
Germano Renan mandando ver no vocal, de forma emocionada e bem postada.
É
isso, para quem gosta de dizer que o rock acabou, essa rapaziada nova de Minas
Gerais dando o recado, e bem dado. E se a ideia é se estabelecer no Brasil e
fora também, começaram muito bem, um disco bem feito, bem produzido, coeso, sem
altos e baixos, com faixas diferentes, mas mantenho um nível alto do início ao
fim. Que sigam assim, para o alto e avante.