“Burn”, 50 anos de um dos clássicos do Deep Purple

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Foi no dia 15 de fevereiro de 1974, há exatos 50 anos, que o mundo recebeu o oitavo álbum de estúdio do DEEP PURPLE, o primeiro da terceira formação da banda, conhecida como “MK III”: David Coverdale, nos vocais, Ritchie Blackmore, na guitarra, Jon Lord, nos teclados, Glenn Hughes, no baixo e vocais e Ian Paice, na bateria.

Mas, antes de entrar nos detalhes desse trabalho fantástico da banda, gostaria de deixar um testemunho pessoal de como esse álbum fez minha cabeça. Era início da década de 80, e, com pouco mais de 10 anos de idade, eu ainda estava procurando “o meu som”! Cresci ouvindo os discos de meu pai, então em minha formação existe muito Queen, Alice Cooper, Genesis, Alceu Valença, Sá & Guarabyra e a disco music de Bee Gees e Earth, Wind & Fire, dentre outros. Mas isso era o som DELE, não o MEU.

O rock nacional estava explodindo, Blitz, Gang 90, Magazine era o que eu ouvia, até que numa visita de família, um primo, cinco anos mais velho que eu, me chamou de canto e disse “você curte rock, né? Vem ouvir isso aqui comigo...”. O Elcio não sabia, mas, estava entortando a minha vida! Ele me apresentou três discos: “British Steel”, do Judas Priest, “London Calling”, do The Clash e “Burn”, do Deep Purple! Até hoje quando o encontro, o lembro de como isso me direcionou.

Mas, voltando aos anos 1970...

As coisas no Deep Purple iam de mal a pior... O vocalista Ian Gillan não estava nada satisfeito com a relação do guitarrista Ritchie Blackmore com o resto da banda e resolveu sair fora logo após a gravação do disco “Who Do We Think We Are”, um disco irregular e que não manteve o padrão do álbum anterior, a fabuloso “Machine Head”, tendo em seu repertório apenas um grande hit, “Woman From Tokyo”, mas, ainda deu seis meses de prazo para a banda decidir seu futuro e encontrar um substituto. No embalo de Gillan, o baixista Roger Glover também decide sair e se dedicar apenas à produção, pelo selo da própria banda, a Purple Records.

E primeiro de tudo, veio da banda TRAPEZE o baixista e também vocalista Glenn Hughes, mas, os líderes do Purple não queriam que ele acumulasse as funções, apesar da empolgação de todos os lados, e queriam outro vocalista. O primeiro desejo era ter Paul Rodgers na banda, que não aceitou o convite e se manteve a frente do Free à época. Rodgers também cantou no Bad Company, no The Firm, ao lado do guitarrista Jimmy Page, e participou de uma aventura do Queen, mas, a pedido do próprio, fez questão de aparecer como convidado e jamais substituto de Freddie Mercury, quando gravaram e se apresentaram como Queen + Paul Rodgers.

Jon Lord e Ritchie Blackmore continuaram sua procura até que chegaram a um garoto de 21 anos chamado David Coverdale, que cantava desde os 15, e estava fechado o time! Ainda era 1973, ensaiaram, prepararam o repertório e foram até Montreux gravar o álbum, usando a mesma unidade móvel de gravação dos Rolling Stones usada na gravação de “Machine Head”, e foi lançado em fevereiro de 1974: “BURN”!

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Por influência direta do baixista Glenn Hughes, o som da banda foi mais direcionado ao soul e ao funk, que na época estavam em alta – basta lembrar os lançamentos da Motown Records no início dos anos 1970. Blackmore não gostou da ideia, mas, engoliu seco e foi voto vencido. Poucos dias antes do lançamento oficial do disco, a banda soltou o primeiro single do trabalho: o compacto com “Might Just Take Your Life”, clássico com tudo o que o Deep Purple tem de melhor: riff pesado e bem colocado, o teclado indispensável de Jon Lord e um belo trabalho vocal. O interessante deste single é que no “lado B” veio a canção “Coronarias Redig”, que ficou de fora do disco e só apareceu na edição comemorativa de 30 anos do álbum.

O álbum abre avassalador, com o riff fantástico da faixa título. Ritchie Blackmore pode ser chato, egocêntrico, intratável e o diabo a quatro do que falam dele, mas, ninguém pode negar o seu talento! Ao lado de caras como Tony Iommi, do Black Sabbath, e Keith Richards, dos Rolling Stones, e isso é mera questão de escolha pessoal, é um dos maiores criadores de riffs de todos os tempos! Músicas do Deep Purple, como “Burn”, “Smoke on the Water”, “Perfect Strangers” ou clássicos do Rainbow como “Man on the Silver Mountain”, “Stargazer” ou “Long Live Rock’n’Roll” não seriam possíveis sem sua genialidade.

Voltando à “Burn”, não bastasse o riff, o trabalho de teclados de Jon Lord é caso de ser estudado. E, novamente, opinião minha: o Deep Purple jamais seria a banda do tamanho que é sem o maestro Jonathan Douglas Lord, o cara mais importante da história do grupo! Basta lembrar que após sua saída o Deep Purple se tornou uma mera banda de covers de si própria, pois não dá para se levar em conta coisas gravadas como “Bananas”, o deprimente álbum de 2003.

Outra coisa a se destacar, o excelente trabalho de dueto de vozes na gravação. Coverdale e Hughes em estúdio soam perfeitos! O que já não acontecia ao vivo! É até engraçado assistir a gravação do show “California Jam”, de 1974. Coverdale inicia cantando “Burn” e vai muito bem, mostrando que a banda acertou na contratação... até que entra Glenn Hugues na segunda voz fazendo os backing vocals e depois assumindo a voz principal na segunda parte da música! Tenho certeza que aquilo foi de propósito e, “ficou pequeno” para o, então jovem, David! A diferença de potência vocal entre os dois é assustadora.


Voltando ao álbum, a segunda música é a boa, e já conhecida “Might Just Take Your Life”, àquela lançada como single três dias antes do disco. Na sequência vem “Lay Down, Stay Down”, e se ainda não falei dele, é hora de citar o sempre correto Ian Paice, um baterista de mão cheia, seguro, firme e que dá ritmo à banda. A última faixa do “Lado A” é “Sail Away”, onde tudo dá certo, o riff, a cozinha redonda de Paice e Hughes, as mudanças de vozes entre Coverdale e Hughes e os teclados viajantes de Jon Lord que são o pano de fundo perfeito do início ao fim da música.

Virando o disco, a primeira faixa é “You Fool No One”, que começa com o trabalho percussivo de Paice e a guitarra solada de Blackmore, como introdução para a entrada das vozes de Coverdale e Hughes juntas, num coro empolgante. Seguindo, vem “What’s Goin’ On Here”, um rock and roll empolgante, onde o destaque é o piano de Jon Lord.

É chegada a vez de um épico, o blues “Mistreated”, parceria de Blackmore e Coverdale, talvez, em minha opinião, uma das mais belas canções de toda a carreira do Deep Purple. Em termos comparativos, é como se fosse “Since I’ve Been Loving You”, do Led Zeppelin ou “Confortably Numb”, do Pink Floyd, um ponto fora da curva.

E o álbum se encerra com a instrumental ”’A’200”, uma peça praticamente progressiva, com espaço para todos demonstrarem o seu talento, Paice, Hughes, Blackmore e Lord tem espaço para criação, improviso e o resultado é instigante.

Este é “Burn”, o primeiro de três álbuns gravados pelo Deep Purple com a dupla Covardale / Hughes. Na sequência vieram “Stormbringer”, ainda em 1974 e “Come Taste the Band”, de 1975, este com o guitarrista Tommy Bolin, substituindo Ritchie Blackmore, que saiu da banda para se dedicar ao seu RAINBOW. Um fato interessante em se observar é que, tirando a já citada “Mistreated” e também “Sail Away”, ambas da dupla Coverdale e Blackmore, todo o restante do álbum foi composto por todos os membros: Paice, Blackmore, Lord, Coverdale e Hughes, porém, na edição original do disco, Hughes não aparece nos créditos, devido a obrigações contratuais, a época de sua saída do Trapeze, isso só veio ocorrer na edição comemorativa de 30 anos.

“Burn” é o que considero DISCOTECA BÁSICA, obrigatório.

Ricardo Cachorrão

Ricardo "Cachorrão", é o velho chato gente boa! Viciado em rock and roll em quase todas as vertentes, não gosta de rádio, nunca assistiu MTV, mas coleciona discos e revistas de rock desde criança. Tem horror a bandas cover, se emociona com aquele disco obscuro do Frank Zappa, se diverte num show do Iron Maiden, mas sente-se bem mesmo num buraco punk da periferia. Já escreveu para Rock Brigade, Kiss FM, Portal Rock Press, Revista Eletrônica do Conservatório Souza Lima e é parte do staff ROCKONBOARD desde o nascimento.

2 Comentários

  1. Eita Cachorrao!! Sempre bons textos para quem quer recordar ou aprender sobre esse tal mundo do rock.

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