Physical Graffiti do Led Zeppelin é muito mais do que um álbum de rock

Foto: Divulgação
Led Zeppelin reunido em sua fase Physical Graffiti
Por Lucas Scaliza

Que o Led Zeppelin é considerado uma das maiores bandas de rock que o mundo já viu, é fato. Mas é incrível como eles ainda continuam influenciando gerações e gerações de artistas contemporâneos. Embora se comente muito sobre os quatro primeiros álbuns do grupo, é necessário olhar com mais cuidado para o que veio depois, especialmente para este Physical Graffiti, que completa quarenta anos de rock cósmico, habilidoso e transcendental.

Physical Graffiti pode não ser um trabalho conceitual, mas ele é chamado de “mãe” de todos os discos duplos que vieram em seguida, visto que não era muito comum lançar um álbum de inéditas assim tão longo (e tão caro de se produzir) naquela época. Mas a banda achou que seria um bom formato quando as oito novas músicas compostas ultrapassavam o tempo médio de um LP. Daí, juntaram estas a outras canções gravadas desde 1970 que acabaram não entrando em seus discos anteriores: uma de Led Zeppelin III (1970), três de Led Zeppelin IV (1971) e mais três de Houses of The Holy (1973). Ele pode não ser o trabalho mais repleto de clássicos da banda, porque essa não era a sua proposta. Mesmo assim, tem rock de sobra (“Custard Pie”, “The Rover”, “Houses of the Holy”, “Sick Again”), baladas (“Down By The Seaside”, “Ten Years Gone”), aquele rock clássico e divertido que você adora (“Boogie With Stu”, “Black Country Girl”), funk rock (“Trampled Under Foot”), sem falar nas épicas “Kashmir” e “In The Light” e na folk “Bron-Yr-Aur”.

Para quem não sabe, Robert Plant, Jimmy Page, John Paul Jones e John Bonham voltaram a Headley Grange, no interior da Inglaterra, para gravar este disco - o mesmo local que gravaram o lendário Led Zeppelin IV. Uma casa grande em que podiam morar por um tempo, tocar tudo o que quisessem, gravar com os equipamentos que já estavam por lá e não pagar por esse serviço em um estúdio. Livres para criar, o quarteto estava fazendo um disco ambicioso. 

“Estávamos forçando os limites da música e sabíamos disso. E nesse álbum […] a coisa toda está cheia de personalidade, tipos de afirmações sobre música, e alguns são realmente inovadores. Tem coisas que podem ser sensíveis e carinhosas e tem coisas que são pesadas e vão na sua direção”, disse Jimmy Page, guitarrista, produtor e grande mastermind do disco.

O nome foi dado também pelo guitarrista. Por volta de 1974, o grafite tinha começado a aparecer nos prédios da Inglaterra com citações do poeta e pintor inglês William Blake, de uma forma bem diferente ainda do que viria a ser quando integrado ao hip hop. No estúdio, Page pensou que gravar uma música em fita magnética é como grafitar também. “A música era uma manifestação física” desse processo, uma reação física.

Embora fossem os membros do Black Sabbath que ganharam fama como ocultistas, principalmente por causa da capa, das letras e do trítono de seu primeiro disco Black Sabbath (1970), o verdadeiro ocultista rockstar da época sempre fora Jimmy Page. Como preparação para o lançamento do disco, ele abriu uma livraria esotérica chamada Equinox, em Kensington. O nome é o mesmo da revista fundada pelo famoso ocultista Aleister Crowley em 1905. A loja vendia o tipo de livros que não eram encontrados nas livrarias normais. Em 1974, depois de terminar de gravar e mixar Physical Graffiti, Page mandou cartões de Natal para os amigos com “Cumprimentos Thelêmicos”, o que indicava sua proximidade com a Thelema, a filosofia de Crowley.

O baixista John Paul Jones foi o maior multi-instrumentista do disco, sendo responsável por executar órgãos, pianos, clavinete, mellotron, sintetizador, violão, bandolim e até fazer um arranjo de orquestra. “In The Light”, a faixa mais experimental e uma das melhores do álbum, é resultado do trabalho de Jones com o sintetizador.

Naquela época, o Zeppelin já era uma das maiores bandas do mundo – e o dinheiro trouxe algumas facilidades para o grupo. Para começar, puderam criar o próprio selo de gravação, Swan Song, do qual Physical Graffiti foi o primeiro lançamento, enquanto a distribuição ainda estava com a Atlantic, a gravadora gigante da época. Essa liberdade criativa permitiu que tivessem maior controle sobre o trabalho e facilitou o lançamento de um disco duplo. Quando a turnê pelos EUA começou em janeiro, ainda antes de o disco chegar às prateleiras, o Zeppelin mostrou a maior produção de palco já vista até então, o que incluía luzes laser e projeções do fundo do palco. Por volta da meia-noite do dia 8 de janeiro de 1975, cerca de 2 mil fãs da banda formaram uma fila para ver o novo show do grupo no Boston Gardens, obrigando a organização a começar a vender os ingressos às 2h30 da madrugada ao invés das 6 horas, como planejado.

Álbum que passa no teste do tempo

Tanto qualquer outro álbum do Zeppelin, Physical Graffiti mostra uma banda em forma, criativa e consciente de tudo o que poderia fazer em estúdio e fora dele. O próprio Jimmy Page diz que sabia o que a banda e o lugar escolhido para gravar o álbum, Headley Grange, poderia oferecer em termos de som naquele momento.

Kim Thayil, guitarrista do Soundgarden, cresceu ouvindo o álbum e soube definir bem o que havia sido a banda até ali. Para ele, o primeiro disco era mais blues, o segundo mais hard rock, o terceiro mais folk. Mas ele não acha Physical Graffiti diferente do resto da discografia ou do que eles fizeram até ali. De fato, não há uma quebra no estilo da banda. Eles continuam agregando influências e destilando o melhor hard rock e blues rock que podiam conceber ao mesmo tempo em que se abriam para as possibilidades criativas dos sintetizadores e colocavam arranjos orquestrais por cima de riffs monumentais. Aliás, por falar nisso, veja que até hoje é o riff de “Kashmir” e de várias outras músicas da banda ainda soam interessantes e modernos, nem um pouco datados.

Conforme o tempo passa para uma banda, é comum que os fãs e o público em geral se apegue mais aos primeiros anos de produção, uma mistura de saudosismo dos clássicos com um certo preciosismo. No caso do Led Zeppelin não é diferente, mas agora tudo o que eles produziram já assumiu um caráter clássico para o rock e para a música do século 20. Aliás, se vê muito da influência da banda até hoje, seja no Wolfmother, seja nos novatos dos Royal Blood, ou veteranos do rock como o Warren Haynes e o Gov’t Mule, os suecos do Graveyard ou em tantas outras bandas que estão por aí. Physical Graffiti é a obra em que eles resumem toda a carreira e ainda propõem coisas novas até hoje.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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