DISCOS: ROBERT PLANT (LULLABY AND... THE CEASELESS ROAR)

ROBERT PLANT

Lullaby And...The Ceaseless Roar

Nonesuch Records; 2014

Por Lucas Scaliza








O vocalista de uma das maiores e mais influentes bandas de rock’n’roll da história poderia passar seus dias morando em uma mansão no sul da França ou em Beverly Hills. Poderia apenas fazer pequenas participações especiais em trabalhos de músicos amigos ou poderia lançar uns discos mequetrefes de vez em quando, só para não perder o costume. Poderia ficar confortável e longe da dor de cabeça que são os holofotes da fama.

Robert Plant não fez isso. Mesmo depois do término do Led Zeppelin (o grupo se reuniu apenas uma vez para um show especial em Londres em 2007, disponível em CD e DVD), o cantor se manteve ativo. Começou a carreira solo ainda na década de 1980 e até participou de três discos ao lado do guitarrista Jimmy Page, amigo e ex-parceiro no Zeppelin. E boa parte do que lançou em carreira solo não tentava imitar o rock que fazia com sua famosa banda na década de 1970. Ele se baseou em música blues, bluegrass, country, experimentalismo, orientalismo, etc.

E é tudo isso que podemos ouvir em seu 10º disco solo recém lançado, lullaby and… The Ceaseless Roar. Além de uma amálgama de quase tudo que Plant já produziu, é um de seus melhores trabalhos solos. Não há nada que se compare, em termos sonoros, ao que ele fazia no Led Zeppelin, mas acredito que você já esperava por isso. No entanto, é um disco para se notar. Sem pressa e sem peso ele se constrói ao redor de progressões de acordes muito bonitas e arranjos de encher os ouvidos, como mostram bem “Rainbow” e “Pocketful of Golden”. E ritmos baseados em regionalismos mil (como “Embrace Another Fall”), country (“Poor Howard”) e até utilização de percussão eletrônica (“Turn it up”). Aliás, “Turn it up” tem um riff e fraseados de guitarra que lembram o Zeppelin. E tem também algo de folk rock na fácil de ouvir “Somebody there”.

Quem acompanha Plant é a Sensational Space Shifters, banda que Plant montou para gravar seu disco ao vivo de 2012. Aliás, absolutamente todas as 11 músicas do disco estão creditadas como composições de Plant e de vários membros da Sensacional Space Shifters, o que deve ter contribuído em larga escala para a musicalidade fluida até mesmo nas partes mais intrincadas e mais experimentais de lullaby and… The Ceaseless Roar. Mesmo assim, o nome que vai na capa do disco é apenas o de Plant. Esse é o peso de sua fama, de sua personalidade no business e de seu nome. Mas bem que poderia ser um disco de “Robert Plant & The Sensational Space Shifters”, como acontece com Nick Cave & The Bad Seeds e Tom Petty & The Heartbreakers.

Duas das melhores faixas do disco são baladas. “House of Love” é uma música que sabe manter o interesse do ouvinte o tempo todo. A voz doce de Plant e o teclado fazendo uma cama para toda a canção nos conduzem pela progressão de acordes. E “A stolen kiss” é uma das melhores composições que já receberam a voz de Plant (estou contando o Zeppelin aqui também, não apenas sua carreira solo e participações). Tranquila e levada principalmente pelo piano, a faixa pisa no freio e deixa que cada nota escolhida em cada instrumento inunde nossos sentidos. E quando chega o refrão, a harmonia e a melodia dá uma guinada em direção a algo mais soturno e triste. Impossível não nos comovermos com o cantor. É uma composição de sensibilidade que só um cantor e uma banda madura poderiam compor e interpretar da maneira mais acertada.

As letras são todas pessoais para Plant, a maioria sobre “voltar para casa”, nos diversos sentidos que essa expressão pode assumir. Em 2010, durante as sessões de seu disco anterior, Band of Joy, Plant começou a namora a cantora americana Patty Griffin. Então ele passou 18 meses em Austin, Texas, sem voltar para seu lar e seus lugares preferidos na Inglaterra e no País de Gales. Quando voltou, viu que tudo estava diferente, que tudo tinha se desenvolvido – exceto ele (palavras de Plant). O relacionamento terminou em 2013 e isso definitivamente teve impacto nas letras do novo álbum.

Plant não força a voz. Plant não canta nas alturas (você não esperava que fosse repetir os vocais de “The Immigrant Song”, esperava?). Ele nem mesmo tenta emular o que já fez anteriormente. É Plant sendo Plant após aprender a apreciar outras nuances musicais depois do disco em parceria com Alisson Krauss (de 2007). lullaby and… The Ceasless Roar é um passo à frente em sua carreira. Mostra diversos lados do cantor, diversas influências e aquela competência estilística, técnica e bom gosto de sempre. Talvez o ouvindo menos experimentado tenha alguma dificuldade em ultrapassar a barreira dos arranjos experimentais da Sensational Space Shifters, mas nada que alguma insistência não seja capaz de tornar natural à audição.

Plant poderia passar a vida toda falando e tocando Led Zeppelin, mas sua veia artística fala mais alto e ele soube explorar sua musicalidade. Não tem o sucesso comercial que qualquer reunião de sua ex-banda teria, mas quem se importa? lullaby and… The Ceasless Roar é música boa e cheia de personalidade.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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