30 anos de "The Real Thing", o disco que mudou a vida do Faith No More

Faith No More na época em que lançou The Real Thing, em 1989
Por Bruno Eduardo 

Quando um disco pode realmente mudar uma vida. Em janeiro de 1991, após uma exibição primorosa no Rock in Rio, muitos brasileiros - incluindo este que vos escreve - saíam do Maracanã (Rock in Rio 2) perguntando: “Afinal, o que era o Faith No More?” A resposta estava na praça há quase dois anos. Tratava-se de The Real Thing, um conjunto de canções, que na época, deu ao grupo americano o status de "futuro do rock".

Mas esqueça tudo o que disseram há trinta anos: se o Faith No More é o Faith No More e se Mike Patton é o Mike Patton, a culpa original é de The Real Thing, o disco que transformou, que mudou, que deu vida a essa banda. Ponto. A verdade é que m
esmo com dois discos na bagagem e assinatura com um grande selo em 1987, eles não passavam de um grupo de rapazes esquisitos da Bay Area que flertava com o pós punk e o funk rock dos Chili Peppers. No entanto, com a saída do vocalista Chuck Mosley e a entrada do carismático Mike Patton - um ano após o lançamento de Introduce Yourself  - a banda enfim aconteceu. 

Para a grande maioria dos brasileiros, o contato com o Faith No More se deu pela MTV - principalmente pelas mãos de Gastão Moreira, que apresentou a banda pela primeira vez em seu início na emissora, além de ter sido também o único jornalista brasileiro a entrevistar Mike Patton para um veículo de TV, quando a banda chegou ao fim em 1998. Antes, Zeca Camargo teria conseguido esse feito, no auge do sucesso (1991).

É curioso dizer que hoje em dia este é o disco pop do Faith No More. Curioso, porque na época, ele era facilmente encontrado nas prateleiras de heavy metal. The Real Thing trazia um rock enérgico e ao mesmo tempo inteligente. Considerado o álbum do ano por tabloides conceituados (como Spin e Kerrang), o disco conseguia misturar as exóticas influências de seus integrantes, e, ainda assim, tinha um som característico para a época- com tendências ao hard/trash. Ironicamente, as tais influências individuais - que sepultariam o grupo no futuro - faziam a máquina funcionar em The Real Thing. A cozinha Gould/Bordin era o que Red Hot Chili Peppers e Living Colour tinham de melhor no momento. E Roddy Bottum, que sempre foi subestimado pelos grandes críticos, tinha uma importância fundamental no som da banda. 

O disco abre com “From Out Of Nowhere” e seu riff de teclado contagiante. Em seguida, o clássico da banda, “Epic”, que foi por muito tempo um dos hits mais inovadores do rock pesado. Mantendo a sequência híbrida, vem o outro hit, “Falling To Pieces”, e a porrada no pé do ouvido “Surprise! You’re Dead!”. Parecia suficiente, mas não era. O lado A (do LP, lógico!) ainda reservaria uma das canções prediletas dos fãs: a excelente “Zombie Eaters”, que traz um misto de drama e ironia na interpretação de Patton - a letra fala da dependência materna, na perspectiva de um bebê (?) - municiada por um instrumental meio nonsense do Faith No More.

O melhor do álbum ainda viria resumido em pouco mais de oito minutos, na progressiva faixa-título. Esta é também considerada pela maioria dos fãs como a melhor letra escrita por Patton no FNM. E aqui ele mostrava todo seu ecletismo, com vocais suaves, agudos e agressividade. 

Underwater Love” revela a capacidade pop da banda em um rock-romântico dos bons; e “Woodpecker From Mars” é uma epopeia instrumental - uma ode ao thrash metal com progressivices (bem ao estilo do guitarrista “persona non grata” da banda, Jim Martin).

No fim do disco, dois grandes momentos: a balada blues e sucesso radiofônico da época, “Edge of the World”, e a cover fidelíssima e brilhantemente executada de “War Pigs”, do Black Sabbath. Muitos fãs não sabem, mas o Faith No More já executava a cover do Sabbath em seus shows desde 1987, ainda com o vocalista Chuck Mosley.

The Real Thing obteve um sucesso estrondoso ao redor do mundo, e popularizou um estilo até então novo, rotulado de funk o’metal. Como era de se esperar, o Faith No More virou moda nos quatro cantos do planeta - aqui no Brasil então, foi uma febre quase incurável. Curioso, é que a banda disse ter recebido o sucesso como um alívio. Segundo o tecladista Roddy Bottum, a sensação do grupo com a fama não foi um "Uau, que demais!", e sim, um "Pôxa, até que enfim!" - nas palavras do mesmo. 

E qual seria a importância de um disco 30 anos após seu lançamento? A vitalidade de sua música! Sobreviver três décadas, intocável, não é para qualquer um. Após The Real Thing, a banda inovou mais uma vez no genial Angel Dust. Mas aí já é uma nova história, que foi contada em um outro capítulo AQUI.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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