Diversificado e coeso, 'Ømni' é o melhor disco do Angra dos últimos 12 anos

Angra chega ao nono disco da carreira com o ótimo "Ømni"
ANGRA
"Ømni"
EarMusic; 2018
Por Lucas Scaliza


A banda brasileira Angra, uma das principais referências em metal melódico do mundo e que sempre foi exemplo de como misturar heavy metal e influências regionais (no caso, os diversos ritmos brasileiros) passou os últimos dez anos perdida em clichês ao mesmo tempo em que tentava agregar novas influências, como o progressivo. O resultado foi uma sequência de álbuns irregulares e que tentavam emular muito mais o power metal europeu do que a identidade que a banda vinha construindo e reafirmando até a renovação com 'Rebirth' (2001).

Em 'Ømni', a banda enfim encontrou seu caminho e demonstra estar alinhada com o power metal de matriz europeia, lançando mãos de alguns clichês do gênero – como mostram as duas faixas introdutórias, “Light Of Transcendence” e “Travellers of Time”. Mas ainda assim, o Angra consegue trazer uma diversidade suficiente para fazer de 'Omni' um álbum mais conciso e que aproveita cada canção para mostrar algo diferente.

Black Widow’s Web” é uma das melhores faixas do álbum, com Sandy (sim, a irmã do Júnior, filha do Durval de Lima, ou Xororó) cantando nas passagens de piano em contraste com Alissa White-Gluz, do Arch Enemy, que faz um gutural monstro. Faixa bem composta, que aproveita muito bem a dinâmica e cada convidado. “Insania” tem um refrão infalível e dá um belo espaço para o baixo de Felipe Andreoli brilhar na mixagem durante o segundo verso da canção. “Bottom Of My Soul” é mais uma vez Rafael Bittencourt tomando conta dos vocais. A canção poderia ser um hard rock bem anos 80, mas as orquestrações e a guitarra pesada cheia de distorção que marca cada mudança de acorde dão uma pompa mais metaleira e sinfônica a ela. Uma boa candidata a música que deve ficar ótima em formato acústico.


'Ømni' certamente não é um novo Angel’s Cry (1993) ou Rebirth, mas é o melhor disco da banda em anos e o faz com consciência. Pode não ser o mais original possível e com certeza não tenta ser o mais arriscado da discografia, mas cumpre o papel de trazer um pouco de cada coisa que o Angra fez bem em mais de 25 anos de estrada, com altos e baixos, em momentos em que estavam muito confiantes - como parece ser o caso de Holy Land (1996) até hoje um marco no metal mundial pela coragem e pelo primor na colagem da música brasileira com o metal e Temple Of Shadows (2004), seguramente o disco mais ambicioso da discografia – e quando precisavam de um produto que se adequasse a um certo tipo de público específico: o fã de metal europeu atual, acostumado com certos níveis de fritação guitarreira e bumbos duplos, vocais altíssimos e certo aspecto épico e fantasioso.

A fantasia entra em 'Ømni' pelo viés de suas letras e conceitos. Como a capa do álbum antecipa, com todos os elementos esotéricos e científicos se misturando a uma figura humana, trata-se de um disco conceitual que parte de 2046, quando uma tecnologia permite quebrar o tecido do tempo e conectar as consciências humanas (e todos os álbuns do Angra) de várias épocas diferentes, levando os humanos a um estágio mais evoluído.

Todo o processo de composição foi feito em Campos do Jordão, numa casa da família de Bittencourt, único representante da formação original do Angra. Depois, cada música foi gravada na Suécia com o produtor Jens Bogren, que já trabalhou com Moonspell, Sepultura, Opeth, Haken e diversas outras bandas do metal e do progressivo. Ou seja: o sueco manja dos paranauês. Difícil saber até onde a concisão estética de 'Ømni' foi trabalho dele ou consciência coletiva de Bittencourt e do resto da banda (visto que todos os integrantes estão creditados como compositores). No entanto, como Secret Garden (2015) também foi produzido por Bogren, fica a sadia impressão de que o Angra evoluiu como grupo em sua nova formação. Não musicalmente, pois mesmo em álbuns fracos a técnica nunca foi alvo de contestação, mas em termos de consciência de como um bom disco deve funcionar. Já que 'Ømni' tira o Angra do limbo e o coloca novamente em uma posição de destaque entre os ouvintes.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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