Angel Dust, o disco mais influente do Faith No More, completa 26 anos

Faith No More na época de Angel Dust, em 1992
Em 2003, a Kerrang lançou uma edição especial com os 50 discos mais influentes de todos os tempos. E para a surpresa de muitos, no topo da lista estava Angel Dust, quarto trabalho de estúdio do Faith No More. Embora hoje o disco seja considerado um dos pilares para o caminho do rock pesado, o lançamento dele, no dia 8 de junho de 1992, foi visto por muitos como uma viagem na contra mão, desagradando gravadora e dividindo fãs no mundo inteiro.

O Faith No More conheceu a fama em 1990, um ano após lançar The Real Thing. O grupo ganhou prêmios, vendeu quatro milhões de discos, tocou para multidões e aturou uma tietagem ensandecida. Aqui no Brasil, o reconhecimento chegou um pouco mais tarde, e talvez por isso, obteve um alto grau de intensidade. Em curto tempo, passaram de desconhecidos ao “futuro do rock”. Esse culto, iniciado numa apresentação memorável na segunda edição do Rock in Rio, rendeu uma turnê nacional disputadíssima no mesmo ano. Mas o que ninguém sabia, era que isso seria o mais perto que o Faith No More chegaria do pop um dia.


Apenas alguns meses depois de ser considerado um fenômeno popular no Brasil, o Faith No More já não era mais unanimidade. A grande verdade é que poucos entenderam a proposta - que era realmente muito subversiva - e com isso, a rasteira foi inevitável. A Warner também não gostou nada do que ouviu e tentou convencer a banda que aquilo poderia ser uma espécie de suicídio comercial. O baixista Billy Gould disse que a gravadora ficou tão assustada quando recebeu o material de 'Angel Dust', que inclusive, chegou a sugerir que eles voltassem para o estúdio e repensassem o álbum.

Tudo em Angel Dust foi tramado e executado durante uma ressaca pós-fama. Até a belíssima capa do disco em contraste com a sua estranha contra-capa era proposital. Billy Gould afirmou que a arte gráfica resumia o álbum, que continha partes lindas e outras extremamente feias. Canções ruidosas como “Malpractice” e “Jizzlobber” disputavam espaço com outras de melancolia sublime, tipo “RV” ou “Kindergarten”. Segundo o baixista, essa disputa não era nada sadia. Angel Dust mesmo dotado de suprema intensidade, causava desconforto até mesmo para a banda. Billy afirmou: “Há em todas as canções, algo que desagrada algum integrante”. No disco, apenas “Everything’s Ruined” chega perto do Faith No More de 1989, o resto é algo completamente imprevisível e multi-composto.

A voz nasalada de Mike Patton, que já era uma marca registrada da banda em músicas como "Epic" e "Falling To Pieces" foi completamente abandonada pelo vocalista. Em Angel Dust, Patton começou a desenvolver a sua variedade vocal, experimentando novos timbres e abusando de letras subjetivas e poéticas. Se a interpretação de Patton foi um ponto alto, artisticamente falando, comercialmente, a imagem "fácil" do vocalista foi desintegrada. Entre banhos de urina, defecação em programas de rádio e visual embrutecido, Patton tornou-se uma figura cult e abominável. E nada mais foi como antes.

Mas não foi só a música que sofreu um enorme avesso. A imagem da banda também foi contaminada pelo momento de repulsa à fama. O grupo de roqueiros cabeludos deu lugar a um estranho quinteto, e os vídeos com efeitos especiais foram substituídos por travestis e scripts obscuros. Afinal, o que tinha se tornado o Faith No More? Hoje, ao ouvir discos geniosamente sem-pés-nem-cabeças como King For A Day, Fool For A Lifetime ou Album Of The Year, a resposta é fácil e óbvia: o Faith No More tinha se tornado uma banda singular.

Tal singularidade expôs o Faith No More a um enorme declínio popular, mas a sonoridade rara de Angel Dust fincou o grupo nos píncaros do pioneirismo do rock pesado - influenciando bandas como Korn, Deftones, System Of A Down, Incubus e Slipknot. 
Em 1992, quase nada era tão estranho e bizarro. Mesmo assim, foi considerado o álbum do ano pela Q Magazine e pela revista alemã Musik Express Sounds.

Angel Dust nada mais é que o último suspiro juvenil do Faith No More. Depois disso, o grupo obteve maturidade esquizofrênica suficiente para manter a sua proposta sincopada e variável. Após Angel Dust, o imprevisível passou a ser o maior rótulo da banda e - independente das insanidades sonoras - ninguém nunca mais foi pego de surpresa.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

3 Comentários

  1. Sempre gosto de ler suas matérias, Bruno! Já cheguei a ler repetidamente. Valeu!
    Daniel

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    1. Obrigado pela leitura de sempre, Fantomas Dor!!! Falar de FNM é sempre um prazer. :)

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  2. Muito boa a matéria.
    O principal é que quem escreveu sabe do que está falando.
    Parabéns Bruno.

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