DISCOS: THE DARKNESS (LAST OF OUR KIND)

THE DARKNESS

Last Of Our Kind

Kobalt; 2015

Por Lucas Scaliza





Faz mais de 10 anos que o The Darkness teve seu momento de superfama. Lembro que entre o estrondo causado por Permission To Land (2003) e One Way Tickett To Hell… And Back (2005), houve um pequeno momento em que a mídia musical estrangeira, sobretudo a inglesa, só falava do The Darkness. O hard rock farofa ressuscitado pelo grupo conquistou até o ex-Primeiro Ministro britânico Tony Blair, que revelou ouvir e curtir a banda.

Mas tão rápido quanto ascenderam às paradas de sucesso, o The Darkness simplesmente saiu de cena. Levou sete anos até que a banda voltasse a lançar material inédito com Hot Cake (2012), mas o disco pareceu um retrocesso. Antes mesmo de lançarem o primeiro trabalho, o grupo era conhecido pelos ótimos shows. Apesar de toda a exaltação do hard rock brega de Los Angeles e datado dos anos 80, havia qualidade musical. Hot Cake, contudo, parecia uma autoparódia deles mesmos, no mesmo esquema do Massacration aqui no Brasil. Músicas que pareciam covers de lados B de bandas que ficaram com um som estereotipado pela estética do hard rock/glam rock oitentista. Pior ainda foi perceber que talvez a melhor faixa daquele disco era a versão farofa de “Street Spirit”, que era de fato um cover – e do Radiohead ainda por cima.

Mas os irmãos Hawkins, compositores do grupo, conseguiram dar a volta por cima. O recém-lançado Last Of Our Kind é ótimo. Continuam comprometidos com o farofice de 30 anos atrás, cabeludos e usando roupas bregas à Steel Panther, mas não soam mais como paródias. A brincadeira é séria e o novo disco exibe elevada qualidade musical e consciência dos clichês da época. Se em Hot Cake as canções eram todas retilíneas e previsíveis, muito baseadas em sequências de acordes apenas, dessa vez há um pouco mais de peso, de riffs e variedade, sem perder o principal elemento da banda: a diversão.

A sonoridade percorre desde o estilo do Mötley Crüe dos anos 80; Bon Jovi pré-1994; passando por Journey e Skid Row. Há riffs musculosos em “Barbarian” e o poder de fogo de “Roaring Waters”, em que o guitarrista Dan Hawkins finalmente mostra a que veio, fazendo ótimos riffs e conduzindo a faixa por diferentes partes. Mais do que reinterpretar o hard rock, Dan praticamente mostra em “Roaring Waters” como havia boas ideias no estilo. Sua execução, mesmo nos solos mais afetados, é sempre límpida e ouvimos todas as notas, sem embromação, como fica claro nos arranjos da animada “Open Fire”, que é praticamente uma celebração do estilo (e não por acaso, primeiro single para as rádios).

Mighty Wings” começa com uma daquelas orquestrações feita por teclados, como se a nave da Xuxa fosse pousar em sua cozinha numa tarde de domingo. Brega? Espere e veja o que se segue: mais riffs grandiosos e ataque poderosos do baixista Frank Poullain. Mais uma faixa que souberam lapidar para que ficasse totalmente dentro da proposta do The Darkness e ainda tivesse algo mais para mostrar ao público de hoje. Já “Hammer & Tongs” é uma praia mais blues e “Last Of Our Kind” parece um daqueles hinos prontos para virar trilha sonora. Ambas utilizam os clichês do gênero. “Wheels of The Machine” é a música menos histriônica do disco e consegue embalar com seus acordes leves. “Conquerors” segue o mesmo modelo, colocando o violão como instrumento fundamental da balada, mas faz um refrão maior para fechar o trabalho em grande estilo.

Um dos diferenciais de Last Of Our Kind é a diminuição de falsetes do vocalista Justin Hawkins. Ele é muito bom nessa técnica, mas dentro do rock não há como não remeter a algo extremamente farofa e brega. Ainda há bastante voz aguda no disco (caso você goste), mas está sendo usada com um maior senso de equilíbrio, diferente do que aconteceu com Hot Cake. “Mudslide” é a composição em que Justin mais utiliza o recurso vocal e, embora possa ser irritante para quem já não tem mais estômago para isso, a faixa ganha com a extrema diversão que proporciona. E o que dizer de “Sarah O’Sarah”, uma faixa mais leve, em que os anos 80 estão presentes desde o riff inicial até os timbres de guitarra usados.

No anos 80 havia uma tendência que levava todas as bandas de rock e hard rock a compor um número significativo de músicas românticas, dado a quantidade de mulheres que se tornavam parte do público dessas bandas, ao acréscimo de sex appeal que aqueles marmanjos conseguiam tocando essas baladas e a própria aceitação desse tipo de composição na MTV, fazendo com que Bon Jovi, Whitesnake, Journey e uma série de outras bandas ficassem conhecidas por um público mais amplo. Mais comprometidos com a diversão do que com essas pressões de mercado, Last Of Our Kind consegue ser mais direto e rock’n’roll mesmo em suas baladas e escapam de um melodrama do tipo de “Carrie” do Europe ou “Is This Love” do Whitesnake. Não acho isso que tenha a ver com maturidade, mas sim com foco em boas composições.

O álbum foi escrito na Irlanda e depois levado para gravação e finalização no estúdio Leeders Farm, na Inglaterra, propriedade do guitarrista Dan Hawkins. As baterias foram gravadas por Emily Dolan Davies, já que Ed Graham deixou o grupo após a turnê de Hot Cake. Contudo, a inglesa já deixou o The Darkness também e a banda deverá entrar em turnê com Darby Todd, que já substituiu Graham ao vivo em 2012.

Após uma volta fraca e calcada no clichê puro, o The Darkness mostra que os anos 80 ainda podem render boas festas, boas bebedeiras, bons romances e bom saudosismo, principalmente quando a banda leva a sério a arte de criar música, mesmo que tenha um quê de zoeira e de gracinha.

Bruno Eduardo

Jornalista e repórter fotográfico, é editor do site Rock On Board, repórter colaborador no site Midiorama e apresentador do programa "ARNews" e "O Papo é Pop" nas rádios Oceânica FM (105.9) e Planet Rock. Também foi Editor-chefe do Portal Rock Press e colunista do blog "Discoteca", da editora Abril. Desde 2005 participa das coberturas de grandes festivais como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, Claro Q é Rock, Monsters Of Rock, Summer Break Festival, Tim Festival, Knotfest, Summer Breeze, Mita Festival entre outros. Na lista de entrevistados, nomes como Black Sabbath, Aerosmith, Queen, Faith No More, The Offspring, Linkin Park, Steve Vai, Legião Urbana e Titãs.

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